O futebol mineiro e as notícias da terra distante
“Brasil está vazio na tarde de domingo, né? / Olha o sambão, aqui é o país do futebol / Brasil está vazio na tarde de domingo, né? / Olha o sambão, aqui é o país do futebol / No fundo desse país / Ao longo das avenidas / Nos campos de terra e grama / Brasil só é futebol / Nesses noventa minutos / De emoção e alegria / Esqueço a casa e o trabalho / A vida fica lá fora, a cama / Brasil está vazio na tarde de domingo, né? / Olha o sambão, aqui é o país do futebol / Brasil está vazio na tarde de domingo, né? / Olha o sambão, aqui é o país do futebol / No fundo desse país / Ao longo das avenidas / Nos campos de terra e grama / Brasil só é futebol / Nesses noventa minutos / De emoção e de alegria / Esqueço a casa e o trabalho / A vida fica lá fora / A cama fica lá fora / A cara fica lá fora / A fome fica lá fora / A briga fica lá fora / A cama fica lá fora / A festa fica lá fora / O tempo fica lá fora / E o homem fica lá fora / A conta fica lá fora / E todos fica lá fora…”.
A letra acima é da música “Aqui é o país do futebol” do mineiríssimo Milton Nascimento.
Desde criança sou um fanático por futebol. Adoro ir a estádios para ver o jogo “in loco”. Gosto de ver a reação dos torcedores, seus comportamentos. Sempre que visito a uma cidade com estádio e futebol profissional, fico louco para ir ver uma partida. Isso acontece aqui no Brasil e fora dele. Cada torcida é diferente e tem sua lógica própria.
Lembro de uma história, que já contei aqui neste espaço, que vivenciei em minha passagem por Madrid, cidade na qual trabalhei em 1999/2000. Fui ao estádio Santiago Bernabéu, do Real Madrid, com meu amigo de trabalho, o Quino. Quando o juiz e os assistentes entraram no campo houve um respeitoso silêncio. Cutuquei o Quino e perguntei por que não vaiavam ou xingavam os árbitros. Ele ficou alguns segundos em silêncio e depois perguntou: “por quê?”. “Porque são os juízes”, respondi com a certeza de um brasileiro que canta durante o “um minuto de silêncio”. Quino parou mais alguns segundos e devolveu: “Mas por quê?”. Na cabeça dele, o juiz não havia feito nada para merecer ser vaiado ou xingado. Na minha, só por ser o juiz do jogo, já era motivo para agredi-lo. É o futebol. Diferente em cada canto do planeta, sendo igual em todos os lugares.
Segunda-feira, dia 14 de junho, contra minha vontade, voltei a São Paulo. Passei quase o ano inteiro de 2020 em Bom Despacho e o primeiro semestre de 2021 inteiro na cidade. Minha universidade, na qual sou professor concursado, me convocou para iniciar uma experiência com aulas presenciais para quem quiser comparecer à aula na própria universidade. Quem não quiser, poderá assistir às aulas à distância. Eu, professor, tenho de estar na universidade fisicamente. Por isso, voltei para minha terra natal.
Fui recebido em São Paulo por um frio intenso e cortante. Passada a primeira semana, continua difícil sair à rua. Tenho corrido pela manhã e quase choro, de tanto frio. Hoje corri com frio e sob chuva forte e gelada. Que saudade de correr em Bom Despacho: mais quente, com paisagens mais bonitas e, claro, na companhia da namorada bom-despachense.
Na segunda-feira, dia 21 de junho, estava assistindo ao jogo Atlético X Chapecoense na TV, quando meu irmão me perguntou: “está com saudades de Bom Despacho?”. “Ainda não, acabei de voltar de lá, depois de um ano e meio. Por que você está perguntando isso?”, quis saber de meu irmão. “Esta semana você viu todos os jogos do Galo, do Cruzeiro e do Coelho. Se isso não é saudade, não sei o que significa”, finalizou a conversa.
Fiquei pensando sobre os jogos. Era verdade. Eu havia visto todos os jogos dos times mineiros mais conhecidos. Sem perceber, mato minha saudade de Minas Gerais e de Bom Despacho vendo os times locais jogarem.
Lembrei de uma história que vi o famoso cientista brasileiro Miguel Nicolelis contar em algum programa de entrevistas na TV. Ele vive mais fora do Brasil do que aqui, pois dá aulas no mundo todo e tem residência nos Estados Unidos. Contou ele nesta entrevista que sempre carrega uma camisa de seu time do coração, o Palmeiras, na mala. Quando está em algum país e o Palmeiras, ou qualquer time brasileiro, vai até a cidade em que ele está, Nicolelis vai ver o jogo. Cancela aulas, abandona compromisso, e vai ver seu time jogar. Ele explica que é um jeito de matar a saudade do time e do país. Contou de um jogo que viu na Rússia, e como se emocionou ao receber um abraço do jogador Vagner Love, que já estava em outra equipe e não mais no Palmeiras, mas que ao ouvir um velho louco gritando em português no alambrado, foi até lá para ver quem era aquele homem. Eu, que nem chego perto da inteligência e importância do Nicolelis, parece que estou fazendo igual. Estou usando o futebol para me enganar e fingir que não estou com saudade de Bom Despacho, da namorada bom-despachense e das pessoas com as quais convivo intimamente ou apenas vejo nas ruas da cidade.
Pensando sobre o assunto, percebi que nos jogos todos que vi nestes últimos dias, torci sempre para os times mineiros. Acredito que esta seja a primeira vez que sei quem são os treinadores do Cruzeiro, Atlético e América. Também não me lembro de nenhuma outra ocasião de ficar triste com a situação ruim de um adversário histórico do meu time. Torço para que o Cruzeiro recupere suas finanças e volte a dar alegria para sua imensa torcida.
Juntei o amor pelo futebol e o interesse recente por Minas e Bom Despacho. Percebi também que tenho aberto todos os links que recebo com notícias de Bom Despacho. Que tenho me interessado mais pelos problemas da cidade, pela política local. Lembrei-me que na semana passada fiquei revoltado e triste, quando meu amigo Saul enviou um vídeo feito por ele no grupo de WhatsApp dos Rancheiros mostrando que haviam asfaltado a pracinha na rotatória de entrada para a cidade, em frente o supermercado Fidelis. Fiquei assim porque ali era um lugar para fazer uma pracinha linda para receber quem chega à cidade e não para ser um lugar sem vida.
Percebi que, definitivamente, virei um cidadão bom-despachense. Meu irmão tinha razão: saudades…