A iluminação de Natal e as lembranças do passado

 

BENÍCIO CABRAL – No final de novembro a Prefeitura de Bom Despacho inaugurou a iluminação de Natal de 2023, na Praça da Matriz. É claro que corri lá para ver, admirar e me emocionar. Tenho certeza de que todo mundo conhece aquela sensação, aquele transe, de se sentir criança por alguns segundos. Criança feliz. É assim que me sinto ao ver as decorações de Natal, incluindo iluminação pública e Árvores de Natal nas casas das pessoas.

Na minha residência todos os anos, seguindo a tradição familiar, nós levantamos a Árvore de Natal, com enfeites, bolas, luzes, até em excesso. É muito bom. Pode parecer piegas, mas esse ritual me faz relembrar a minha saudosa mãe, pessoa que fazia questão fechada de montar Árvore de Natal todos os anos. Ela tinha motivação religiosa, eu tenho motivos emocionais, culturais.

Famílias vão à Praça da Matriz apreciar a beleza do Natal

Relembro muitos fatos da minha infância relacionados com as decorações de Natal e o dia de Natal propriamente dito. Fomos criados no rito católico bem estrito e, portanto, assistir à Missa do Galo era uma prática importantíssima. O problema é que eu sempre tive o costume de dormir cedo e consequentemente não conseguia manter os olhos abertos. Na hora H alguém me chamava e lá ia eu para a Igreja da Matriz, passar cerca de uma hora ouvindo o Padre e, como se diz, pescando.

E eu gostava, pois para mim tudo o que a aura natalina envolve está coberto de uma névoa de mistério e emoção. De certa forma, até hoje.

Árvore de Natal

Como eu dizia acima, montar a Árvore de Natal é um pouco como ressuscitar a minha mãe. Ela sempre punha os filhos para participar da montagem das Árvores de Natal na minha casa. Nos últimos anos da vida dela, idosa, ela apenas cobrava e supervisionava os trabalhos. Eu sempre ia lá na casa dela, com minhas filhas, e a gente montava a Árvore, bem bonita, como ela gostava.

Agora alguns fatos curiosos sobre as Árvores de Natal da minha infância. Em Bom Despacho as pessoas não compravam árvores, simplesmente porque não existia esse produto no mercado. A gente saía para o mato, escolhia uma galhada bonita, cortava e trazia para casa. Essa galhada virava a Árvore de Natal.

Cada ano a minha mãe fazia de um jeito, conforme as novidades que vinham pelas amigas e comadres. Um ano pintava a árvore com tinta a óleo, em geral branca ou prata. Outro ano, cobria a árvore com mechas de algodão, para simular neve. Teve um ano que a árvore da minha casa foi coberta de pipoca, também para simular neve. A dificuldade foi conseguir pipocas suficientes para colar na árvore, pois a meninada não deixava sobrar estoque.

As bolas de Natal eram de vidro, um vidro espelhado, muito fino. Eram bolas muito leves, mas em compensação, qualquer queda era uma confusão. Voavam caquinhos de vidro pela sala inteira. Uma criança pequena não podia nem chegar perto dessas bolas. Era preciso ter cuidado redobrado. As bolas de plástico, de hoje em dia, podem até brilhar menos, porém evitam alguns acidentes.

As guirlandas de luzinhas para colocar nas árvores eram muito caras, havia poucas opções, gastavam mais energia elétrica e, o que é pior, eram ligadas em série, a fim de economizar a fiação e os bocais. Para quem não conhece essa denominação, as ligações normais, em casa, são paralelas e não em série. Na ligação em série cada item depende do outro, ou seja, cada lâmpada, para funcionar, depende da anterior. Se uma lâmpada se queimava, toda a guirlanda parava de funcionar. Para consertar era necessário pegar uma lâmpada de reserva e testar cada bocal, um a um, até a guirlanda se acender novamente.

Havia pisca-pisca naquela época, só que diferente de hoje. O pisca-pisca era um adaptador que se colocava na tomada elétrica da parede. O plug da guirlanda de luzes era conectado ao pisca-pisca, em vez de entrar diretamente na tomada. Aí era só esperar alguns segundos e as lâmpadas começavam a piscar. Parecia uma seta de carro, sim-não-sim-não-sim-não. Não havia diferentes padrões de pisca, como hoje.
Me esqueci de outra coisa importante, que era o Presépio. Até acho que podia faltar uma Árvore de Natal em alguma casa, mas Presépio de jeito nenhum. A minha mãe sempre fazia um Presépio bonito, com um espelhinho simulando um laguinho e outras delicadezas. Eu viajava na imaginação olhando o Presépio. A manjedoura ficava vazia até a meia-noite do dia 24.

O presente do meu Pai

Eu tenho muitos irmãos e dessa forma éramos uma meninada grande. Muitas crianças para os meus pais presentearem. A minha mãe nunca abriu mão de dar um presente, um brinquedo, um jogo, para cada filho, outra tradição que mantenho com muita alegria. Nós colocávamos, cada um, um par de sapatos ao pé do Presépio e ao amanhecer o dia 25 encontrávamos nossos presentes.

Bicicleta era um bem muito caro e inacessível naquela época, início dos anos 1960. Certa feita o meu pai juntou um dinheirinho e decidiu dar uma bicicleta de presente de Natal. Presente que marcou nossas memórias afetivas para sempre. Ao despertarmos lá estava a bicicleta, próxima ao Presépio, com um bilhete escrito à mão: PARA TODOS. Nossa, que alegria!

Anos depois decidimos retribuir o impagável carinho do meu pai. Era aniversário dele e videocassete era um artigo cobiçado. Nós, os filhos, fizemos uma vaquinha e compramos um videocassete. Entregamos para o meu pai, a 24 mãos, e no embrulho havia um bilhete escrito à mão: DE TODOS.

(Benício Cabral é bacharel em Direito, escritor e servidor público federal aposentado / Fotos: Benício Cabral)

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