O tempo passa e as amizades permanecem

 

VANDER ANDRÉ ARAÚJO – Há quem afirme que certas amizades são para sempre. Devem ter razão. Dizem que, ao longo da vida, o número dos nossos amigos íntimos vai diminuindo, ficando mais restrito.

Nos nossos tempos de escola, na década de 1980, quando ainda não éramos seduzidos pelo apelo das redes sociais que prometem nos conectar, em Bom Despacho vivíamos cercados de bons amigos. Trocávamos confidências, brincávamos pelas ruas ou nas casas uns dos outros. Era só alegria na praça do Colégio Miguel Gontijo!

Hoje, parece que desaprendemos um pouco isso. O mundo nos empurra cada vez mais para o isolamento, para o perfil fake da felicidade numa rede social, para a satisfação medida em likes, seja no feed, no story ou em mensagens no direct (tudo, aparentemente importado, sem muita importância…)

No ano passado, tive a grata satisfação de reencontrar duas turmas de colegas da época da escola: uma do primário, dos anos de 1977 a 1981, e outra do fundamental, de 1982 a 1985. Foi uma diversão danada para nós, agora “cinquentões”, rindo à toa lá no restaurante Fazendinha.

A iniciativa parece que inspirou outros reencontros. Recebi do dermatologista Sérgio Rodrigues a notícia de que sua turma da 8ª série, a 802 do Colégio Tiradentes, se reuniria em Nova Lima, no sábado, 16 de agosto, para comemorar 30 anos de formados! O plano inicial era fazer o reencontro na mesma fazenda no Engenho do Ribeiro onde se reuniram para comemorar o final do ciclo fundamental de estudos, mas acabaram fazendo próximo à capital mesmo.

Como o tempo passa… Fiquei impressionado com o cuidado com que prepararam o evento, cheio de recordações dos bons tempos em que conviviam diariamente em Bom Despacho. Curiosamente, na mesma semana, a escritora Gísila Couto também me informa que a sua turma de colegas, do Colégio Tiradentes, vai se encontrar em dezembro para comemorar os 40 anos de Formatura.

Segundo Débora Carvalho, uma das 22 participantes (dos 42 que se formaram há 30 anos) do encontro em Nova Lima, “Foi muito mais do que um simples reencontro de colegas. Entre histórias, cartas, risadas e cerveja, cada um pôde se reencontrar também consigo mesmo e com uma parte importante de sua própria história.” E completou: “Parte do que sou foi construído ao lado dessas pessoas. Rever a vida que parecia esquecida, mas que permanece tão viva e significativa, foi uma experiência única.”

Sérgio Rodrigues recordou que, há 30 anos,ainda não havia as redes sociais. Da 5ª à 8ª série, eram quase sempre os mesmos colegas, “os amigos da vida”. Depois, os caminhos se dividiram: alguns foram para mais longe, outros seguiram juntos em repúblicas, parcerias profissionais na medicina e até mesmo na vida militar.

O reencontro, iniciado ainda na época do Orkut e fortalecido pelo grupo de WhatsApp, trouxe de volta a sensação de pertencimento e laços que o tempo não conseguiu desfazer.

Segundo eles, foi um momento de reviver muitas memórias daqueles tempos em Bom Despacho. A famosa foto das meninas deitadas no chão em círculo, feita durante uma das festinhas da turma, ganhou uma releitura regada a vinho e até os filhos entraram na brincadeira, repetindo a cena.

Alguns professores também foram lembrados por eles com carinho, e o evento contou com a presença da professora de Geografia, Dona Biga, que foi especialmente de Bom Despacho, representando o corpo docente. Os colegas também se lembraram com muito carinho do Prof. de Língua Portuguesa Almir, que foi o padrinho da turma, falecido recentemente.

As lembranças fluíram na tarde de sábado: das cartinhas trocadas antes da era digital, das travessuras como o chiclete colado na cadeira e as guerras de “chup-chup”, até os trabalhos de hemeroteca que, mesmo difíceis na época, ajudaram a construir uma base sólida de conhecimentos para a escrita de textos na vida adulta.

O orgulho da trajetória de cada um também esteve presente. Da turma, surgiram médicos que atuam em Bom Despacho, como Sérgio Rodrigues e Flávio , além do Jarbas; advogados, psicólogos, engenheiros, militares, empresários e tantos outros que reforçam o conceito de que Bom Despacho é berço de talentos!

Alguns construíram carreiras de destaque, outros espalharam suas vidas por diferentes cantos do Brasil e do mundo — Brasília, Rio de Janeiro, São Paulo, França, interior de Minas. Muitos hoje são pais, mas ainda não há avós no grupo. Os filhos, que participaram de parte daquela celebração, puderam ver de perto a força da amizade que atravessa gerações.

Foi também uma viagem no tempo para os anos em que surgiam bandas como Skank e Legião Urbana, os “sete melhores” da Jovem Pan embalavam os dias, e Bom Despacho celebrava a inauguração do Village Night Clube. Uma época marcada por sonhos, descobertas e amizades que continuam vivas e inspiraram a arte estampada na camiseta comemorativa criada por eles.

Mais do que um reencontro, cada vez mais eu percebo que essas celebrações das histórias coletivas de bom-despachenses são muito bonitas de se ver e acompanhar, construídas com afeto, companheirismo e memórias que permanecem para sempre no coração de cada um e reforçam o vínculo com nossa cidade natal, mesmo que as pessoas estejam geograficamente distantes.

Citando o poeta Drummond, para quem as chamadas coisas “findas”, no poema Memória, sobrevivem ao tempo, concordo muito com ele: o que acaba se cristaliza de alguma forma, ganhando um novo valor; a beleza que permanece viva em nossa lembrança. Tomara que essa lindeza permaneça para que, segundo o mesmo poeta, não se transforme em “apenas um retrato na parede”. (Portal iBOM / Vander André é advogado, filósofo, escritor e aposentado).

 

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