Depressão é uma coisa com a qual não se brinca
O que vai no íntimo de cada um tem muita intensidade e percorre caminhos inexplicáveis.
ROBERTA GONTIJO TEIXEIRA – Sou moradora do bairro Esplanada há 24 anos. No mês de março ocorreram três autoextermínios só no meu bairro. Na verdade, dois consumados e um tentado. O terceiro, socorrido a tempo, encontra-se em estado grave no hospital.
Todos eram homens acima dos 50 anos, meus vizinhos e conhecidos. Um, morava tão perto que, quando foi encontrado, ainda vivo, ouvi, de dentro de casa, os gritos de desespero e a espera pela ambulância.
Foi muito triste. Um deles me marcou particularmente. Era um homem de meia idade, bonito, com a família estruturada, aparência sempre agradável e serena. Nunca, a meus olhos, demonstrou qualquer transtorno. Fiquei verdadeiramente abalada com a partida dele. Além do mais, seus pais e irmãos me acolheram de forma bem carinhosa quando me mudei para o bairro. Sua esposa e filha, quando Leo era vivo, eram frequentadoras da minha casa. Foi como se mais um pedaço da minha história de vida tivesse partido.
Bom, toda essa introdução pesada é porque gostaria, depois de todos esses ocorridos, falar um pouco sobre autoextermínio. Apesar de ser um tema bem espinhoso e desconhecido para mim, achei inevitável enfrentá-lo.
Sempre soube que depressão é coisa com a qual não se brinca. O que vai no íntimo de cada um tem muita intensidade e percorre caminhos inexplicáveis. Sempre gostei de conversar sobre subjetividades, mas do tema autoextermínio sempre fugi.
Algumas vezes, quando estou em hotéis ou edifícios muito altos e vou passar a noite, tranco bem a janela porque, numa espécie de neurose, penso: e se eu sonhar que estou pulando de algum lugar, abrir a janela e involuntariamente me jogar? Já chequei até a conversar sobre isso com algumas pessoas e delas ouvi o seguinte: “não se preocupe, isso não ocorre, temos todos uma autoproteção inconsciente, até os sonâmbulos têm”. Assim espero.
O medo de que alguém que eu gosto atentar contra a própria vida também me assombra. Quando isso acontece procuro desviar a atenção e pensar em algo positivo. Nesse momento, contudo, cheguei à conclusão de que essa talvez não seja a melhor solução. Desejei ler e entender um pouco sobre o que se conhecesse a respeito do autoextermínio.
Outro dia, Alexandre Magalhães, meu companheiro, estava em casa e o trabalho dele disponibilizou alguns cursos, não sei ao certo se obrigatórios ou não. Dentre eles um sobre autoextermínio. Ele me contou e achei estranhíssimo. Pensei: nossa, eu nunca faria um curso sobre isso, mas os últimos acontecimentos me fizeram rever essa postura.
Achei essencial tentar compreender o que faz alguém chegar num ponto tão extremo e o que podemos fazer para evitar.
Apesar de o sofrimento ser uma condição inerente do ser humano, de forma individual e coletiva, no Brasil e no mundo, alguns não conseguem olhar para a tristeza como uma doença. Outras não têm sequer tempo de observar e cuidar dela e há, ainda, os que pensam que isso é de somenos importância.
Sei que movimentos e propostas vêm sendo feitos, mas ainda são modestos e, na maioria das vezes ignorados por muitos.
Segundo uma pesquisa realizada em 2020, o autoextermínio está entre as 20 principais causas de morte no mundo e alcança pessoas de todas as crenças e idades. Alguém perdeu um pai, uma mãe, um irmão um amigo, um conhecido, um filho por esta razão. E, nesses casos, além de ter que lidar com a dor da perda, precisa se haver com as dúvidas e, penso eu, com a sensação de culpa, que presumo ser inócua, mas inevitável.
Como agir? O que fazer? Com quem conversar? Como abordar esse tema tão delicado e urgente? Eu francamente não sei.
Esta semana conversei com minha agente de saúde aqui do bairro e pedi que fosse feito algum movimento promovido pelo PSF. Tentei abraçar e rezar pelos envolvidos nas tragédias. Desejei que Deus afastasse qualquer circunstância desse tipo do meu caminho e da rota dos que amo e, também, dos que desconheço.
Penso que essas são medidas e pensamentos muito limitados e subjetivos, mas foi o que consegui fazer.
Que ousemos tratar melhor e mais de perto desse tema tão delicado. (Portal iBOM / Roberta Gontijo Teixeira é bacharel em Direito, ambientalista e servidora pública federal / Foto ilustrativa).
Roberta ainda bem que teve coragem de explanar sobre tema tão importante ecada vez mais impactante e recorrente .
Quanto é triste muitos estarem, não por querer que a vida finde e sim os problemas, entendendo como que auto-extermínio seja a solução.
Pior que não ter a força e o envolvimento necessário sobre o que fazer para combater tais sofrimentos acompanhados de atitude. É não fazer nada e ver a banda passar, digo é ver os cortejos passarem e infelizmente, quero até estar errado, como a incentivarem novos procedimentos. As atitudes boas arrastam, mas embora eu queira que não as ruíns também.
Que pecamos a Deus sempre para nos livrar à todos de tais pensamentos …