Vultos inesquecíveis do nosso passado

 

TADEU ARAÚJO TEIXEIRA – Gostamos de quando em quando fazer uma excursão pelo passado, não só porque é uma forma romântica de o reviver e muito da alma de nossa gente, como e sobretudo porque é uma proveitosa maneira de fazer as novas gerações tomarem conhecimento dos fatos, das coisas, dos costumes, dos homens, principalmente dos homens que nos antecederam e nos prepararam elementos e condições para nossos dias.

O memorável Dr. Hudson Gouthier de Oliveira

Nesta edição quero falar da Santa Casa de Bom Despacho e de um admirável homem, o grande Dr. Hudson Gouthier, primeiro juiz de Direito de Bom Despacho, que foi baluarte da Santa Casa nos seus primórdios, quando ainda funcionava na velha sede da atual rua Faustino Teixeira. Sede que se situava acima do prédio do Clube Bom Despacho e se estendia por todo o terreno do atual Coronel Praxedes até a Avenida São Vicente de nossos tempos.

Em 1927, a nossa Santa Casa de Misericórdia (assim se denominava nossa benemérita instituição) havia saído de uma penosa crise, vencendo dificuldades que talvez hoje não suportasse. Vivia ela um período de franca preparação para o levantamento do seu novo hospital no local que ocupa em bela praça da cidade, atualmente.

Naquele ano de 1927, em março, a Santa Casa realizou uma assembleia para eleição de sua nova diretoria. Diz o texto da época:

“Naquela assembleia, foi apresentado o relatório do sr. Provedor (o Dr. Hudson Gouthier), no qual minuciosamente, numa linguagem polida s.s. relata o ocorrido durante o período de sua administração.

Com justiça se refere aos diversos servidores da casa apreciando a conduta de cada um, elogiando-os merecidamente e, em particular, o sr. José Agostinho e sua ilma. esposa, enfermeira do estabelecimento. Dentre todos, coloca a pessoa do Dr. Miguel Gontijo em relevo, eis suas próprias palavras: ‘Esse moço e competente profissional, faz jus aos nossos agradecimentos pelos relevantes serviços prestados e muito justo seria que, como singela homenagem, o seu nome figurasse como um dos irmãos beneméritos e benfeitores’.”

Segue o relatório do provedor Dr. Hudson Gouthier, um documento claro e preciso. Dele ressalta a grande operosidade desse ilustre cavalheiro em prol da Santa Casa, instituição a quem lhe foram confiados os seus destinos, numa administração próspera e apta para um período de remodelação, à espera da construção do novo prédio (que é o atual na Praça Irmã Albuquerque). Na assembleia de março de 1927 foi reconduzido como provedor da Santa Casa o Dr. Hudson.

Ilustre juiz e cidadão

Dr. Hudson para aqui veio como juiz municipal do Termo Anexo. Foi o primeiro juiz de Direito da Comarca de Bom Despacho. Elemento perfeitamente ajustado e integrado nos meios da família bondespachense. Foi diretor do nosso Clube Bom Despacho por dois mandatos. Foi provedor da Santa Casa por duas vezes, em seguidas eleições. Foi um amigo. Foi um bondespachense pra valer.

Fez bem por merecer que se consagrasse e se conservasse titulando o novo edifício do Fórum da comarca de nossa terra.

Depoimento do Dr. Nicolau Leite

Um seu ilustre contemporâneo, o Dr. Nicolau Teixeira Leite, escreveu sobre ele: “A sua comunicabilidade aberta, natural, espontânea para com ricos e pobres, em nada prejudicava a severidade do Juiz, a retidão do magistrado que ele soube ser. Por isso, com certeza e justiça, seu nome se perpetua gravado na fachada do edifício da Justiça – o Fórum – a que ele serviu com amor. Hoje, Fórum Hudson Gouthier”.

O passado não pode morrer: é a história.

José d’Avó Gontijo: patriarca dos poetas bom-despachenses

José da Vó Gontijo nasceu em Bom Despacho no dia em 17 de abril de 1860, quase 163 anos atrás. As primeiras publicações de seus escritos foram feitas, por Nicolau Leite, no jornal “O Bom Despacho”, nos anos de 1970. Em vida não publicou nenhum livro. Mas muitos de seus preciosos manuscritos, guardados por uma admiradora dele em cadernos escolares, foram conservados e expostos, com versos escritos a partir dos anos de 1880.

Recentemente, o Sesc de Bom Despacho editou parte de seus poemas em um grande e belíssimo livro, graças à iniciativa do Dr. Robinson Correia Gontijo que era parente do poeta, como outras pessoas da cidade: o homônimo Zé d’Avó, morador por muitos anos da Rua Dr. Miguel, pai de dona Íris, 2ª esposa do Dr. Nicolau Leite, da Marta, da Mônica, da professora Lourdes Gontijo, do Orlando “Fordinho”, etc. A família de D. Irene Morais, esposa do sr. Marcos Morais e mais gente ainda daqui.

Ele foi nosso primeiro gênio literário que produziu com exuberância no estilo romântico.

Saudades de Bom Despacho

José d’Avó Gontijo

Poema escrito em 3 de novembro de1895, na fazenda dos Machados

I – Tenho saudades de meus dias idos, / De amores perdidos, cheios de ilusão; / Dos meigos sonhos de risonha idade, / Guardo saudades no meu coração.

II – Tenho saudade do chorar das fontes, / Dos horizontes do meu Bom Despacho; / Tenho saudades da antiga Biquinha, / Que lá sozinha corre triste e baixo.

III – Tenho saudades das gentis donzelas / Lindas, tão belas, de enlevo sem par; / Da voz saudosa do meu Jerominho, / Quando sozinho cantava ao luar.

IV – Tenho saudades das mil nervosias, / Das mil teimosias do velho Mourão, / Quando as mãozinhas juntas, esfregando, / Vinha ralhando-me em longo sabão.

V – Tenho saudades das noites serenas, / Meigas, amenas, cheias de mistério; / Dali, de tudo me recordo agora, / Mesmo da Flora – até do cemitério.

VI – Tenho saudades das boas celatas, / Lá das serenatas do João Machado, / Do olhar das moças, do licor e vinho / Do bom Tininho – o mais gotoso achado.

VII – Tenho saudades, vou finalizar. / Vou rematar a minha amolação. / Dando um suspiro igual a imensidade, / Que diz – Saudades tenho do Florão. (Portal iBOM / Foto: Hudson Gouthier / Wikipedia)

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