Agropecuária: por 4 séculos o baluarte da economia de BD

 

A atividade agropecuária tem sido a mola-mestra da economia bom-despachense, desde o século XVIII, quando os portugueses, vindos principalmente de Pitangui, ocuparam nosso território fértil, banhado por tantos córregos, ribeirões e pelos rios Capivari, Picão e São Francisco.

Para sustento e manutenção das pessoas, com o trabalho do negro escravo, plantava-se o arroz, o feijão, a mandioca, a cana, o algodão. Deste e com a lã dos carneiros, fabricavam-se as roupas para vestir o povo. Colchas quentinhas para aquecê-los no rigoroso inverno de então. Fazia-se o polvilho, a rapadura e o açúcar mascavo e a cachaça. Criavam-se aves, porcos, bois, carneiros, cabritos para se extrair ovos, a carne, o leite e o couro. Do barro da terra, das varas da capoeira e das madeiras abundantes, construíam-se as pequenas casas rústicas ou velhos casarões senhoriais de pau-a-pique.

O comércio gerado pela agropecuária

Cerca de dois terços ou mais das famílias viviam na zona rural, o resto na zona urbana do arraial ou da vila, da cidade. Vivi na fazenda de meu pai e na de meu avô até 1960. Durante quase todo aquele tempo fui testemunha de que sua produção era autossuficiente para a sobrevivência de seus moradores. Numa fazenda, era costume quase nada ser comprado no comércio. Dizem que no começo só se gastava dinheiro adquirindo sal, querosene e arame farpado que não existiam na região.

Carros de bois e tropas de mula

Região em que a agropecuária sustentava o povo e cambiava muita riqueza para os produtores. Nas fazendas produziam-se mercadorias para exportação. Meu bisavô materno, José Joaquim da Costa (Zé Rufino) a partir dos finais de 1880, até os princípios do Século XX, organizava caravanas de carros de bois e exportava as mercadorias da fazenda como toucinho, açúcar preto, rapadura, cachaça para entrepostos em Curral del Rei, onde hoje existe Belo Horizonte. Outras vezes até Formiga. Ia mesmo até, atrás de sal, à cidade de Capivari, em São Paulo, na Serra da Mantiqueira, próximo a Campos do Jordão. Carradas de produtos eram lá vendidos nestas longínquas regiões. De lá ele voltava com os carros cheios de sal, querosene e arame farpado, comercializados em Minas Gerais. Outros produtores também fizeram fortuna com esse comércio.

Ao falecer em 1940, Zé Rufino deixou três fazendas com milhares de alqueires de terra para seus três filhos: Minha avó Maria, no Raposo, Juca Rufino, no Picão e Berto Rufino, na Extrema.

Meu bisavô materno também fez fortuna com esse comércio em tropas de mulas, nos anos 1860, 70 e 80. Ele levava produtos agrícolas para a capital do Império. E então trazia tecidos finos, joias, relógios, sapatos, perfumes, ricos adornos, armas. Até pouco tempo, podia-se ver o “quarto da loja” onde ele expunha suas finas mercadorias e as vendia para compradores que vinham de longe para adquirir aquelas novidades.

A importância de Pitangui

Por volta de 1756, ocorreram as primeiras incursões de combatentes dos escravos fugidos em terras do atual município de Bom Despacho. Pitangui – a Vila do Ouro – criada em 1915, era o único centro urbano (vila ou hoje cidade) desta vasta região do Oeste Mineiro. Foi a mãe e o centro de expansão civilizatória portuguesa que tornou possível a criação de nosso município e de todas as cidades em nossa volta, que hoje conhecemos. Com as riquezas da mineração Pitangui se sobressaía na construção dos grandes casarões, na ordem administrativa, na religião, na cultura e no povoamento do lugar.

Fim do ciclo do ouro e o início da agropecuária

Mas por volta de 1756 o ouro havia minguado. A coroa portuguesa decretou então que era preciso ocupar o território próximo com fazendas de produção agropecuária. Com engenhos para produzir rapaduras, açúcar e cachaça. Com gente para gerar riquezas que implicavam impostos e tomar posse das terras em nome dos lusitanos.

Dominados os quilombolas que impediam a entrada do homem branco no território de cá do Rio Lambari, nas plagas do futuro Bom Despacho, Engenho do Ribeiro e adjacências, formaram-se as sesmarias. Sesmarias doadas a lideranças que haviam participado da “guerra” aos quilombolas – capitães do mato e suas tropas, milícias de Pitangui e demais lideranças, que os mataram em combate, prenderam ou recambiaram os negros fugidos para seus antigos donos.

Sesmarias

Sesmarias eram colossais glebas de terra entregues a um cidadão que tivesse saído bem em serviços à coroa portuguesa. Esse teria que instalar moradia, levar família e escravos e iniciar as atividades de agricultura, pecuária e engenhos de cana de açúcar. Entre os agraciados com sesmaria contava-se o Alferes Luís Ribeiro da Silva da milícia de Pitangui, capitães do mato e até o Padre Agostinho Pereira de Melo, capelão da tropa que se instalou na atual Cruz do Monte, com a construção, além do acampamento, de uma capelinha de pau-a-pique que Padre Agostinho dedicou a Nª Srª do Bom Despacho, a qual daria mais tarde nome ao povoado, à cidade e ao município em que vivemos.

Sementes das fazendas de hoje

Com o decorrer dos séculos as sesmarias – cujas terras eram repartidas entre as diversas gerações de herdeiros – foram se transformando em fazendas de proporções menores como conhecemos e assim chegamos ao século XXI. Bom Despacho modernizou-se. Perdeu seus ares sertanejos. A população, que vivia na roça até o século XX, mudou-se na maioria para a cidade. Neste século a agropecuária continuou pujante no município. A mola mestra de nossa economia, gerando riqueza e empregos. A partir da metade deste século veio o grande salto gerador da nossa modernidade rural: a Cooperativa Agropecuária de Bom Despacho – Cooperbom – e posteriormente a então Cooperativa de Crédito Rural de Bom Despacho, Credibom.

A agropecuária surgiu nas terras de Nª Srª do Bom Despacho do Vale do Picão pelos fins de 1780 e perdura como baluarte de sua economia até os dias de hoje.

O Sindicato Rural

Não sem razão, o Sindicato Rural de Bom Despacho – que está na linha de frente da defesa e valorização do produtor rural – está buscando novos e auspiciosos caminhos para o crescimento do setor transformando a exposição agropecuária numa feira técnica e de negócios.

Neste ano de 2022 a exposição, que completa 50 anos, investe na modernidade e na apresentação de tecnologias avançadas a serem aplicadas nas atividades do campo.

É Bom Despacho vendo avançar, no universo inesgotável da ciência moderna, preciosa contribuição para o progresso de nossa atividade econômica maior: a agropecuária.

Tadeu Araújo

Tadeu Araújo Teixeira é professor, escritor, colunista e membro da ABDL

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