O Oscar da Amizade
Oscar Cardoso deixa um exemplo de amizade que compartilhava com cada um de nós
ITAMAR DE OLIVEIRA – Quando ingressei no Curso de Jornalismo da Faculdade de Filosofia da UFMG, em 1967, tive a certeza absoluta de fazer a escolha mais importante da minha vida.
Durante anos, no curso secundário, já havia sido secretário, tesoureiro, vice-presidente e presidente da gloriosa União Municipal dos Estudantes de Bom Despacho, que já tirava o sono dos donos do poder local.
A nossa geração, onde se destacaram rapazes e moças corajosos e idealistas, conseguiu a proeza de mobilizar o povo e foi uma das poucas cidades de Minas Gerais a eleger um jovem prefeito de oposição, que conseguiu promover importantes realizações no campo político, administrativo e cultural da nossa terra.
Seguindo a orientação serena do nosso guru da época, padre Vicente Rodrigues, cheguei em Belo Horizonte e logo me envolvi com o movimento estudantil universitário que sonhava em transformar o Brasil em uma grande nação fraterna, solidária e desenvolvida.
Gastamos um bom pedaço da nossa existência para vencer as forças políticas, econômicas e sociais que, através do golpe civil-militar de 1964, implantou um regime autoritário que durou vinte e um anos. Só terminou com a redemocratização promovida através da Constituição-Cidadã de 1988.
Fiz meus caminhos pelo mundo e tive a honra e o privilégio de ser eleito vereador e fui o relator da primeira Lei Orgânica de Bom Despacho, em 1990, no final do século XX.
Claro que fiquei longe da nossa terra por muito tempo. Mas Bom Despacho nunca me deixou. A régua e o compasso da nossa geração me orientaram sempre.
Uma das minhas batalhas mais importantes aconteceu no campo da comunicação. Não vou cansar ninguém contando vantagens ou desvantagens das vitórias e derrotas que a vida nos impõe em todos os campos da nossa existência.
Como Darcy Ribeiro sou obrigado a admitir que sofremos derrotas terríveis. Atualmente, então, temos de reconhecer que o mundo inteiro caminha na contramão dos nossos sonhos libertários e igualitários. Sou um perdedor que jamais gostaria de estar ao lado dos vitoriosos.
Costumo fugir, como o diabo fugia da cruz, das redes sociais repletas de mentiras, agressões e com constantes apologias da violência, da calúnia, e do racismo. Sofro muito contra a celebração das armas e do culto ao capitalismo selvagem que aumenta a segregação e a separação do mundo entre magnatas, ricos, pobres e miseráveis.
Sei que posso muito pouco na luta contra a superação das desigualdades. E não entro nas redes informatizadas porque não quero, de jeito nenhum, estabelecer conflitos desnecessários, com pessoas que possuem o direito de construir o mundo com suas escolhas.
Tem uma coisa que considero valor maior: o respeito ao próximo e o afeto às pessoas que aprendemos a amar. Não quero saber de briga pessoal com ninguém. Continuo disposto a lutar no campo das ideias e na seara política. Amigo é coisa para se guardar no fundo do coração, já nos ensinou a canção.
Oscar Cardoso
Escrevi e coloquei estas palavras no papel para celebrar uma grande figura que faleceu ontem e será sepultada hoje (7/4), no bosque da Esperança, em Belo Horizonte:
Oscar Cardoso. Um amigo inesquecível de todos que o conheceram. Sorridente, afetuoso, prestativo, trabalhador. Cada um de nós tem um retrato muito bonito do Oscar para mostrar e enaltecer.
Fiquei entristecido com a viagem do nosso Oscar. Ele não deixa apenas saudade.
Deixa um exemplo de amizade que compartilhava com cada um de nós. Sem discriminar ninguém. Sabia o que a gente pensava. Entendia nossas lutas. Ficava do nosso lado por um motivo aparentemente banal: nosso amor comum a Bom Despacho estava e esteve sempre acima de todas as coisas.
Acho que a morte do Oscar é repleta de significação: tudo que começa, um dia, acaba.
Mas o sonho da gente, não morre jamais.
O Oscar Cardoso conquistou e merece o OSCAR da amizade.
Descanse em paz, menino Oscar.
Belo Horizonte, 7 de abril de 2022.
ITAMAR DE OLIVEIRA é jornalista e professor