Maura Lopes Cançado: a maior escritora que já viveu aqui
LÚCIO EMÍLIO JÚNIOR – Em nossa cidade não faltam artistas e, em especial, escritores. Na cidade há a Academia Bom-Despachense de Letras e até mesmo um editor anda por aqui, recentemente homenageado pela Câmara Municipal: Eduardo Lucas Andrade, da Editora Literatura em Cena. No entanto, a escritora de renome nacional que já viveu aqui, e pouco celebramos, foi Maura Lopes Cançado. Precisamos dar mais atenção a esse nome. Quem tem esse sobrenome na cidade é parente dela. A esposa do Dr. Clodomiro, Dona Ângela, é parente próxima e Rodrigo Anaya Rojas, meu tio, comentou sobre o assunto falando comigo falando na “tia Maura”.
Maura era filha de um fazendeiro rico de São Gonçalo de Abaeté. Ela veio aqui, ainda nos anos 40, aprender a pilotar no bairro São Vicente, então Campo de Aviação – que na época era realmente um aeroporto. Como ela conta em sua “autobiografia” Hospício é Deus, editado pela primeira vez em 1965 e reeditado em 2015 pela Editora Autêntica, ela uma vez tentou jogar o avião em cima de uma casa. Ao tentar justificar-se, ela afirmou ser fascinada pela ideia de causar um acidente de avião. Ela não cita Bom Despacho no livro, mas o jornalista Maurício Meireles citou nossa cidade como importante na formação da escritora no prefácio que escreveu para a editora Autêntica.
Maura, então apenas uma menina de dezesseis anos (ela nasceu em 1929), dividia sua paixão por aviação com Jair Praxedes, filho do famoso Coronel Praxedes (também da mesma idade). Ela contou, em seu diário de hospício, ter sido casada durante um ano com Jair Praxedes, mas ter-se apaixonado pelo seu sogro, desiludindo-se do casamento. Ambos tiveram um filho chamado Cesarion Praxedes. O jornalista Pedro Rogério Couto, que vive em Brasília, afirmou que Maura foi uma das fontes inspiradoras de um romance chamado Bela Noite para Voar (2001, Thesaurus), livro em que foi baseada a minissérie com o nome JK da Globo em 2006. A vida e obra de Maura inspiraram também o romance A Origem da Água, de Ana Cristina Braga Martes. A partir dos anos 60, fixou-se no Rio de Janeiro, onde trabalhou no jornal Correio da Manhã e, segundo ela, Fernando Sabino foi quem a indicou para sua primeira editora.
No Rio, conheceu artistas tais como Tônia Carrero, por quem disse, em carta a Vera Brant, ter se sentido desprezada. Maura vivia entrando e saindo de internações em clínicas psiquiátricas. Torquato Neto, jornalista e letrista da tropicália, ficou no mesmo hospital, em Engenho de Dentro (título aproveitado por ele), e citou Hospício é Deus. Em crise, dilapidava heranças, brigava com os amigos, perdia empregos. Depois de sua morte, em 1993, foi lembrada em artigos por Carlos Heitor Cony, Reinaldo Jardim, Nelson de Oliveira e Ferreira Gullar, entre outros. Hoje na Internet existem vários vídeos, lives, e várias dissertações de mestrado sobre sua obra.
Em 2011, no último de nossos festivais de inverno, realizei o roteiro de um vídeo sobre Maura chamado Hospício é Deus, junto do cineasta Sérgio Villaça. Curiosamente, o vídeo foi colocado no canal de um membro da família Lopes Cançado e teve 3.200 visualizações. Eu convido vocês a verem o vídeo e a sonharem com novos festivais de inverno:
Assista ao vídeo no canal de Jorge Lopes Cançado clicando AQUI
Lúcio Emílio do Espírito Santo Júnior é filósofo, professor e escritor.