A morte das abelhas
Em 1962 a americana Rachel Carson descobriu algo assustador: nos Estados Unidos estavam sumindo as aves, os pequenos animais, os insetos, as abelhas. Depois de alguns anos de investigação, ela demonstrou que a culpa era dos pesticidas usados nas lavouras e no combate aos mosquitos. De modo especial, o DDT, que começou a ser usado intensamente pelos ingleses no início da segunda guerra mundial e depois teve seu uso ampliado para o mundo todo. As consequências negativas foram severas. Mas os venenos agrícolas não são os únicos responsáveis pela morte de insetos, abelhas, aves e todos os animais que participam desta cadeia alimentar.
O DDT foi descoberto no século XIX, mas até 1939 não teve uso importante. Foi quando um químico suíço descobriu uma de suas propriedades marcantes: a capacidade de matar. O DDT mata insetos e muitos outros animais. Nada escapa ao seu poder mortal: gafanhotos, grilos, caranguejos, piolho, mosquitos, barbeiros, abelhas. Todos estes morrem logo à primeira aplicação. Depois continuam morrendo por longo tempo após a aplicação. Até anos.
Esta capacidade de matar pequenos animais incômodos para o ser humano transformou o que era um produto de uso quase nenhum antes da segunda guerra, num produto de uso variado e intenso após a guerra.
No Brasil, por exemplo, o DDT foi usado com muito sucesso no combate ao barbeiro da doença de chagas e ao mosquito da dengue. Os criadores de galinha passaram a usá-lo para combater os piolhos nos seus animais. Pais e mães o adotaram como tratamento padrão para combater os piolhos dos seus filhos. Na década de 50 e 60, para onde quer que se olhasse, lá estava o DDT.
Além de sua eficácia como eliminador de bichos inconvenientes, ele tinha quatro propriedades que o tornaram um verdadeiro símbolo do progresso de pós-guerra: o baixo custo, a falta de cheiro, a eficácia para matar os bichinhos indesejáveis e a percepção de que não era venenoso para o ser humano. Infelizmente, só percepção.
Na segunda metade da década de 1950 o que Rachel Carson demonstrou foi algo bem diferente. O DDT era um assassino de amplo espectro. Ele matava não só os mosquitos indesejáveis, mas também todos os animais que participavam da cadeia alimentar começada pelos mosquitos. Ou seja, o fazendeiro jogava o DDT no mosquito, mas com ele também morriam os morcegos e as aves que comiam os mosquitos.
No solo, o DDT envenena as minhocas e tudo que come minhoca também se envenena: peixes, tartarugas, cágados, pássaros, galinha.
No solo ou no pasto, o DDT envenena as vacas e os porcos. Quem come a carne destes animais também se envenena.
A gestante que consome qualquer animal envenenado com DDT também se envenena. O que é pior: as mães passam o veneno para o filho mesmo antes de ele nascer. Depois que nasce, ela continua envenenando o filho pelo leite.
O que Rachel Carson descobriu mais de 60 anos atrás foi a forma como o DDT ia passando da água, do solo ou de um animal menor para um animal maior, até chegar em nós. Em nós o DDT se manifesta mediante doenças variadas, mas principalmente pelo câncer. Por causa disto, em muitos países este produto foi proibido há mais de 50 anos. No Brasil, porém, a proibição total ao produto só chegou em 2009, com a lei nº 11.936/2009. Um longo atraso com relação aos países desenvolvidos.
Isto significa que muita gente teve que morrer antes que a proibição chegasse. Mas, demorou tanto, que muita gente ainda vai morrer por causa dele.
Com a morte das aves que comiam insetos, minhocas e frutas contaminas pelo DDT, as matas ficaram silenciosas. Foi deste silêncio fúnebre que Rachel Carson tirou o título do seu livro mais famoso: “Primavera Silenciosa”.
Foi a primeira vez que os cientistas e políticos viram que alguns produtos industriais, por mais atraentes que sejam, podem acarretar consequências trágicas que não são vistas imediatamente. Entre 1939 e 1960 o DDT foi usado tão intensamente, que era comum encontrar casas, plantações, lagos e pessoas cobertas de pó. Em Bom Despacho mesmo isto foi visto ao longo de muitas décadas. Os governos promoviam seu uso intenso.
Bom, uma das consequências do uso do DDT no estado da Califórnia (Estados Unidos), foi a diminuição da produção agrícola.
Conforme nós aprendemos na escola primária, as abelhas têm papel fundamental na produção de flores, frutas, abóboras e tudo mais que depende da polinização por intermédio de insetos. Com a morte delas, as laranjeiras já não davam tanta laranja. A produção de mel também caiu. Os fazendeiros não estavam perdendo só o canto dos pássaros; eles estavam também perdendo dinheiro. Eles descobriram, então, que usar DDT não era bom nem para a economia nem para a saúde.
O Eucalipto e as abelhas
Para produzir mel, cera e própolis as abelhas precisam de néctar e pólen. Por isto qualquer planta que tenha flores em abundância atrai as abelhas. Para elas, é como se fosse um grande restaurante ao ar livre. Ou um grande supermercado, de portas sempre abertas.
Uma das culturas que tradicionalmente atraía as abelhas era a de eucalipto. Esta é uma planta com mais de 700 variedades naturais e todas elas produzem flores em grande quantidade. No entanto, o avanço tecnológico na produção de mudas está mudando esta situação.
Acontece que algumas variedades de eucalipto de altíssima qualidade industrial não produzem flores e não dependem delas para sua reprodução. Em vez de sementes, a indústria usa a clonagem. Ou seja, de uma planta sadia e que tenha as qualidades desejáveis são extraídas células que são cultivadas e se transformam numa árvore com as mesmas características da mãe.
Para plantas produzidas por clonagem, as flores são desnecessárias. Podem até mesmo ser um incômodo. Talvez um prejuízo, pois elas consomem seiva. Afinal, produzir flores e sementes exige energia.
Mas, esta vantagem para a produtividade agrícola é uma desvantagem para as abelhas. Elas perderam suas flores e já não podem mais pastar. Em consequência, onde há eucalipto clonado sem flores, as colmeias são menores, produzem menos mel, menos cera, menos própolis. Em alguns casos podem até mesmo desaparecer completamente.
É por causa disto que os produtores de mel estão preocupados com a produção de mudas de eucalipto por clonagem. Para eles, o ideal seria o cultivo de eucalipto com flores.
A esperança está na criatividade humana
Ao longo da história da humanidade percebemos que muitas vezes os avanços numa área trazem prejuízos em outras. Quando isto acontece, pessoas dedicadas acabam encontrando alguma solução que mantenha os avanços, mas elimine os prejuízos.
Está na hora de especialistas examinarem mais de perto a questão dos eucaliptos sem flor. Provavelmente será possível encontrar uma solução que preserve a produtividade da madeira sem retirar os alimentos das abelhas.
O ser humano precisa cada vez mais de madeira para a construção civil, para a geração de energia, para a produção de aço. Mas o ser humano precisa também de um pouco de mel para adoçar a vida.