Época de eleição: as diferenças entre SP e Bom Despacho
Nasci e vivo em São Paulo há cinquenta e quatro anos, com raros períodos de exceção, quando morei fora da cidade. Fora destes períodos, o momento que me ausentei mais de minha cidade natal foi em 2020, quando passei os meses de janeiro, fevereiro, final de abril, maio, junho, julho, agosto e 17 dias de setembro em Bom Despacho.
Nestes dois anos escrevendo para o Jornal de Negócios, tenho me dedicado a olhar as diferenças entre as cidades nas quais divido meu tempo, São Paulo e Bom Despacho. Hoje, vou fazer este mesmo exercício, mas focado no período eleitoral. E, acreditem, não há nada mais diferente entre nossas cidades do que o aspecto político.
Em meus cinquenta e quatro anos, vi pessoalmente apenas uma prefeita, a Luiza Erundina, que governou a cidade entre 1989 e 1992. Lembro-me claramente do momento em que a vi. Era o período de campanha, portanto, ela não era ainda a eleita. Eu estava caminhando em direção à estação de metrô Santana (que nesta época era a estação inicial – ou final – da linha azul do metrô, papel que deixou há algumas décadas, pois a linha foi expandida), quando ouvi uma gritaria, gente apontando para o local por onde eu iria passar em alguns segundos. De repente, aparece na minha frente uma pequena senhora, que em minha memória não devia ter mais do que 1,5 metro de altura, sorridente, perguntou se eu já tinha candidato e, diante de minha total paralisia, me deu um panfleto da campanha e continuou a caminhada.
Esta foi a única vez cheguei perto de um prefeito em minha cidade e, tecnicamente, nem prefeita ainda ela era. Nunca mais!
Em dois anos visitando Bom Despacho, eu conheci e conversei com o ex-prefeito Fernando Cabral, almocei algumas vezes com sua esposa Alcione (em companhia de minha namorada bom-despachense, claro), além de encontrar com ele e com ela várias vezes pelas ruas da cidade. Além do ex-prefeito e de sua esposa, posso dizer que sou amigo de um de seus irmãos, o Marcelo Cabral, com quem já almocei, tomei cerveja, fiz trilhas no meio do mato, além de ter passado uma noite inteira conversando, com ele e com sua esposa Vera, durante um dos encontros musicais do Circuito dos Ranchos, grupo sobre o qual já escrevi algumas colunas.
Em relação ao atual prefeito, o Bertolino, que já encontrei algumas vezes nas ruas de Bom Despacho, posso dizer que sou amigo de sua irmã, que é amiga de infância de minha namorada bom-despachense, já a tendo encontrado inúmeras vezes, e tendo frequentado a casa de sua mãe na cidade em uma tarde/noite em que fomos visitar sua filha que estava em Bom Despacho a passeio.
Fora esse contato “íntimo” com o poder, algumas vezes aconteceu de eu estar proseando com o Ivan, em sua lanchonete na Praça da Matriz, e ele apontar alguém e dizer algo como “este é o fulano, candidato a prefeito este ano” ou “aquele que está atravessando a rua é o beltrano, ex-prefeito em tal data”.
Em São Paulo, com seus vinte milhões de habitantes, não é comum ver o prefeito na rua. Ele não anda a pé. Tirando o Fernando Haddad, que costumava ir de ônibus para a prefeitura (pelo menos fez isso em algumas épocas), o prefeito se desloca pela cidade usando vários veículos, um que o leva, sempre com motorista e seguranças, e outros com policiais e seguranças. Falar com o prefeito paulistano é para poucos. Os secretários paulistanos também usam carros, motoristas e seguranças. Parecem pop-stars e são quase inatingíveis para os simples mortais, como eu.
Em Bom Despacho, com uma população bem menor, o prefeito é mais acessível, além de não usar o aparato logístico em seus deslocamentos, de não ter seguranças que o cercam e de ser conhecido de todos, saber o nome de quase todos os cidadãos do município, suas relações familiares, onde moram etc. É outra realidade.
Apesar das diferenças enormes entre nossas duas cidades, há algo que as aproxima nesta eleição: a violência dos ataques aos adversários. Em São Paulo, tradicionalmente, durante as eleições há ataques aos adversários, acusações de falcatruas, relatos na imprensa de erros cometidos na vida, casos extraconjugais dos oponentes, tentativas mil de acabar com a reputação do outro. Em Bom Despacho, como alguém me colocou em um grupo do Facebook, cujo foco é a cidade, tenho visto vários posts com comentários agressivos sobre os candidatos. Enquanto estava em Bom Despacho, não sei se em agosto ou setembro, soube que um grupo anônimo enviou cartas sem assinaturas para os munícipes, segundo algumas versões, contendo inverdades sobre o Jornal de Negócios e algum candidato. Nesta semana, já em São Paulo, minha namorada bom-despachense me contou que alguém jogou um explosivo no comitê de campanha do atual prefeito.
Minha expectativa, conhecendo um pouquinho de Bom Despacho, era que a campanha eleitoral seria mais civilizada do que em São Paulo, já que todos os candidatos se conhecem, conhecem as famílias, alguns são amigos, estudaram juntos, ou seja, não colocariam o cargo de prefeito acima das relações pessoais construídas ao longo de décadas. Mas, neste mundo dividido em que vivemos, especialmente após a última eleição presidencial, a parte ruim da eleição paulistana parece ter chegado a Bom Despacho.
Estou torcendo para eu estar bem enganado. Bom processo eleitoral, Bom Despacho!