Comidas que uns adoram e outros nem conhecem

 

ALEXANDRE MAGALHÃES – Há tantas diferenças entre São Paulo e Bom Despacho, apesar de estarem no mesmo país e a apenas setecentos quilômetros de distância, que parecem cidades de povos diferentes, como chineses e angolanos, ou separadas pelo tempo, como babilônios e ingleses.

Porém, raramente um tema me toma tanto tempo de reflexão como as diferenças na oferta de alimentos nas duas cidades.

As diferenças são tão grandes, que quando minha namorada bom-despachense vem a São Paulo, invariavelmente, ela insiste em ir à feira-livre que há perto da minha casa, e que funciona toda quarta-feira entre 3:00 horas da manhã, quando inicia-se a montagem das centenas de barracas de “tudo quanto há“ (expressão bem bom-despachense), até às 13:30 horas, quando desmontam-se as barracas e os caminhões-pipa da Prefeitura de São Paulo passam lavando a rua.

Separei oito comidas que ou os bom-despachenses não conhecem ou os paulistanos ignoram: Acelga, Figo in natura, Jaca, Ora Pro Nobis, Suã, Pé de Galinha, Pescoço de Peru e Marrom Glacê.

Acelga

Eu adoro a verdura Acelga. Toda semana, na feira-livre, eu compro uma destas maravilhas. Ela é do tamanho de uma melancia, pesa entre cinco e dez quilos, tem o centro da folha dura e suculenta e as laterais das folhas bem fofas. Adora comê-la crua com shoyo, molho japonês salgado, ou cozida e temperada com azeite ou páprica. As folhas têm mais de cinquenta centímetros de comprimento, podendo chegar a uns oitenta centímetros, e são bem largas. Um pé desta planta dura semanas e gera mais de dez saladas enormes. Fica durinha e deliciosa por muito tempo. Não estraga por nada. E custa muito barato, uns R$ 5,00.

Para minha surpresa, minha namorada bom-despachense nunca tinha ouvido falar na Acelga.

Da última vez que ela veio a São Paulo, já em 2024, levei-a até feira-livre, mostrei o que era e comprei um exemplar gigante. Passou três dias comendo Acelga, tão apaixonada que ficou.

Perguntei sobre a Acelga para vários parentes e amigos bom-despachenses e todos ignoram o que seja.

Figo in natura

Figo e jaca são minhas frutas preferidas. Quando eu era criança, entre meu nascimento até meus dez anos de idade, havia uma figueira no quintal de minha casa. Cresci comendo figos in natura. É doce, macio, saborosíssimo.

Em São Paulo, pode-se comprar figos in natura, sempre em caixas de oito unidades. Na feira-livre perto de minha casa, encontra-se com facilidade. O Sérgio, dono da banca onde compro frutas (há dezenas de bancas como as dele nesta feira-livre) sempre guarda uma caixinha de figos in natura para mim. Muitas vezes escondo os figos bem no fundo da geladeira, só pelo prazer de comê-los todos sozinhos.

Para minha surpresa, nem minha namorada bom-despachense, nem seus pais, nem seus amigos, incluindo meu professor de violão, o Boleka, conheciam o figo in natura. Todos achavam que só existia o figo em caldas, aquele verdinho que vende-se no supermercado com um caldo bem açucarado. Boleka me perguntou umas três vezes em seguida: “existe outro figo, diferente do que compramos em compotas?”. Tive de explicar que é a mesma fruta, só que o figo in natura é mais doce, muito maior, muito mais gostoso e saudável do que a sua versão em calda.

Quando minha namorada bom-despachense vem a São Paulo, sempre compro uma caixinha extra de figos in natura, para que ela possa comê-los (sem comer a minha cota, que desta eu não abro mão…).

Jaca

Uma vez escrevi neste mesmo espaço sobre minha paixão pelas Jacas. Adoro, compro e como em escala industrial.

Meu amigo Marcelo Cabral, quando leu minha coluna sobre minha predileção pela Jaca, me parou nas ruas de Bom Despacho para perguntar se eu queria ganhar umas Jacas, pois elas existiam no sítio da família e ele nem sabia que dava para comer aquilo. Levou-me umas três e ocasionalmente, quando sabe que estou em Bom Despacho, me presenteia com mais algumas.

Minha namorada bom-despachense e seus pais nunca experimentaram uma Jaca.

Nestas duas últimas semanas, época das Jacas moles (sim, há a jaca mole e a dura, as duas deliciosas, mas com consistências diferentes) tenho comprado ela inteira na feira-livre. Pode-se comprar em pequenas bandejas, já prontas para comer, em pedaços ou inteira, pagando-se por quilo. Na semana passada comprei uma de seis quilos, o que me custou R$ 48,00. Que valeu cada centavo!

Doce, doce, doce, a Jaca mole que comprei é inigualável no sabor e no cheiro que deixa na casa e na geladeira. Uma maravilha.

Para todos que perguntei em Bom Despacho sobre já ter experimentado Jaca, foram unânimes em dizer que nunca comeram.

Que desperdício!

Marrom Glacê

Quando eu era criança, meu pai sofria nas nossas mãos, minhas e de meu irmão logo abaixo de mim na idade, pois exigíamos que meu velho pai comprasse, no mínimo, três latas de marrom glacê a cada compra, doce à base de batata doce, que era uma de nossas paixões infantis.
Fiquei décadas sem comer e nem pensar nesse doce, até que em fevereiro deste ano, estávamos comendo um lanche no Churrasquinho do Fabinho, quando vimos que ele havia começado a vender Romeu e Julieta (Queijo e Goiabada) assado na brasa. Experimentei um espeto com dois de cada e acabei lembrando do marrom glacê de minha infância. Comentei com minha namorada bom-despachense sobre o doce e, claro, ela nunca tinha ouvido falar nele.

No dia seguinte, perguntou nos supermercados se conheciam este doce e depois de uns dias, achou o marrom glacê. Comprou-o e fez uma surpresa para mim. Mas, a surpresa maior foi descobrir que nem meu sogro, nem minha sogra haviam ouvido falar no marrom glacê, menos ainda haviam experimentado a guloseima.

A lata foi disputada a tapa e todos ficaram apaixonados pelo doce. Uma delícia.

Perguntei a vários amigos bom-despachenses e ninguém havia experimentado o marrom glacê na vida. Que desperdício.

Suã de porco

Conheci a Suã de Porco em Bom Despacho, em uma festa do Circuito dos Ranchos, evento gastronômico-musical que reúne algumas dezenas de bom-despachenses apaixonados pela vida, pela música, por uma cerveja gelada ou vinho e por boa comida mineira.

Nunca escutei este termo em São Paulo e perguntei para vários amigos paulistanos e mesmo nos açougues da cidade. Apenas um açougueiro sabia o que era e, adivinhem, era um mineiro de origem.

Pés de Galinha

Em Bom Despacho encontro pessoas que são apaixonadas por pés de galinha e os devoram com voracidade. Minha sogra e sogro, quando minha namorada bom-despachense prepara este prato, mudam até o humor, de tanto que gostam de um pezinho de galinha.

Não conheço ninguém em minha cidade natal que gosta de comer pé de galinha.

Pescoço de Peru

A variação do pé de galinha é a paixão por comer pescoço de peru. E conheço várias pessoas em Bom Despacho que adoram comer esse prato.

Tampouco tenho amigos que têm hábito de consumir esta iguaria.

Ora pro Nobis

Antes de conhecer Bom Despacho, se alguém me perguntasse se eu sabia o que era Ora pro Nobis, muito provavelmente, eu responderia que era um remédio.

Nunca havia escutado o nome desta verdura, muito menos havia provado o alimento. Hoje, sou apaixonado pela verdura Ora pro Nobis que, infelizmente, nunca encontrei na minha feira-livre em São Paulo. Entre os feirantes, alguns até dizem saber o que é, mas que nunca viram à venda na cidade.

Quanta diferença!

(Portal iBOM / Alexandre Sanches Magalhães é empresário, consultor e professor de marketing, mestre e doutor pela USP e apaixonado por BD e SP / Imagens arquivo).

Alexandre Magalhães

Alexandre Sanches Magalhães é empresário, consultor e professor de marketing, mestre e doutor pela USP e apaixonado por SP e BD

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *