As ruas de minha Bom Despacho

 

“O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia / Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia / Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia / O Tejo tem grandes navios / E navega nele ainda, / Para aqueles que vêem em tudo o que lá não está, / A memória das naus. / O Tejo desce de Espanha / E o Tejo entra no mar em Portugal. / Toda a gente sabe isso. / Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia / E para onde ele vai / E donde ele vem. / E por isso, porque pertence a menos gente, / É mais livre e maior o rio da minha aldeia. / Pelo Tejo vai-se para o Mundo. / Para além do Tejo há a América / E a fortuna daqueles que a encontram. / Ninguém nunca pensou no que há para além / Do rio da minha aldeia. / O rio da minha aldeia não faz pensar em nada / Quem está ao pé dele está só ao pé dele.”

O poema acima é de Alberto Caiero, um dos apelidos de Fernando Pessoa. O poema chama-se “O rio da minha aldeia”.

Sempre que alguém me pergunta algo sobre Bom Despacho ou me pede para comparar a cidade com São Paulo, este poema do grande Fernando Pessoa me vem à mente.

Bom Despacho não é tão grande como São Paulo, não é tão rica como São Paulo, mas Bom Despacho é a terra de gente que amo… por isso, Bom Despacho é mais importante do que qualquer outra cidade na minha vida… e que faz aniversário dia 1° de junho.

Meus cantinhos em Bom Despacho

Em São Paulo há milhares de restaurantes, milhares de bares, milhares de cafés, milhares de tudo. Mas, por isso mesmo, sou um anônimo nestes milhares de lugares.

Em Bom Despacho, há menos diversidade, mas em todos os lugares que frequento, muito pelo carinho que as pessoas têm com minha família bom-despachense, sou tratado pelo nome, como uma pessoa única e importante. Isso não tem preço…

Sinto-me em casa na Panolli, onde a Sandy e a Gilvania me tratam com tanta atenção. Mesma situação quando vou ao Na Praça Lanches, onde me sinto um rei pelo tratamento que recebo do Ivan, da Flavia, da Tamara, da Silvinha… Onde em São Paulo vou encontrar o sorriso sempre aberto do seu Tarcisio do Xuá? Impossível! Quando vou ao KiMassa, a Thais já sabe que não como carne e anota minha salada substituindo todos os elementos de origem animal por vegetais e legumes. E passou a instrução para todos os atendentes! Que carinho! Até a atendente do Fidelis da Linha já sabe que vou atrás de empadas de palmito. Às vezes eu estou a vinte metros dela e ela já me faz um sinal de negativo ou positivo, indicando “não tenho” ou “hoje tenho empadas de palmito”, sempre acompanhado de um sorriso. Na Praça de Esportes, me sinto em casa! Dos porteiros, Serginho e Dinho, passando pelo pessoal da academia, o Lineker e Michele, ao professor de natação (que nem faço), o Marcelo, um acolhimento apaixonante. E o atendimento no Bar do Fabinho e da Ana? Sem comentários. Os dois estão sempre sorridentes, acompanhados dos ajudantes. E a Mercearia do William, o lugar mais simples, frequentado por gente da vizinhança, mas onde sou recebido sempre com uma simpatia sem igual do próprio William e de sua ajudante Fantinha. O William até me deu o barco do Palmeiras, que ficava em uma parede do estabelecimento, alegando que só eu torcia pelo Palmeiras… Citaria toda a cidade, se houvesse espaço.

A Matinha, minha paixão bom-despachense

Todos os domingos e em alguns dias de semana, corro na Matinha, perto dos Cristais. Não canso de me emocionar com a mata, os bichos, os gritos dos macacos, os animais que aparecem ocasionalmente, como cobras, veados, quatis, seriemas, as enormes borboletas azuis cintilantes, entre tantos outros. Ah, a Matinha de Bom Despacho não é a Amazônia ou o Pantanal, mas é a mata de minha terra adotiva… Lembrei o Fernando Pessoa novamente.

As festas populares de Bom Despacho

Paulistano e ignorante que sou (perdão pela redundância) sobre a cultura brasileira, adorei conhecer as festas populares de Bom Despacho. Participei de duas e me emocionei muito: Folia de Reis e Reinado. Acompanhei o grupo de Folia de Reis liderado pelo Luis Alberto na casa de uma amiga, a Eleuza, e fiquei feliz com a beleza da festa e com as músicas. Gostaria de ver pessoalmente a Dança das Enxadas, que vi em vídeo e gostei muito. Espero participar destas festas por muitos anos, aprendendo mais sobre a cultura popular brasileira.

O Circuito dos Ranchos e a CorreBom, monumentos da humanidade

Duas coisas que me encantam em Bom Despacho: o Circuito dos Ranchos e a CorreBom. Exemplos de disposição, organização, paixão e prazer. O primeiro, um grupo de amigos que decidiram se encontrar mensalmente para tomar boa música, beber e comer bem. É tão apaixonante, que decidi aprender violão. Contratei o Leo Assunção e estou tentando muito… E a CorreBom, grupo de corredores que congrega gente de todas as idades, todas as velocidades e todas as distâncias. Todos trabalham arduamente só pensando no bem-estar dos bom-despachenses. Que orgulho de pertencer a estes dois grupos.

Todas as rosas têm espinhos…

Todas as paixões são acompanhadas por brigas ocasionais. Como costumo dizer que nós só brigamos quando temos interesse em continuar a conviver. Então, tenho minhas diferenças com Bom Despacho, pois amo esta relação.

Grande parte da cidade não tem calçadas (passeios, como dizem por estas bandas), o que obriga muita gente a andar pelo meio da rua. Além de perigoso para os moradores, pois podem ser atropelados, há lugares que se pode torcer ou quebrar uma perna se insistirmos em andar pelo passeio.

A cidade cheira a queimado em grande parte do ano, especialmente no período de estiagem. Os bom-despachenses, até os que conheço e considero como amigos, colocam fogo no mato, no lixo, em restos em geral. Além de ecologicamente condenável, torna a respiração mais difícil, especialmente de quem gosta de caminhar, correr ou pedalar pela linda cidade.

Cães e gatos dominam a cidade. Em todas as ruas de Bom Despacho é possível encontrar cachorros dormindo do meio da rua, comendo lixo, dormindo nas portas de muitas lojas, enfim, uma tristeza. Muitos são atropelados, porque vivem soltos. O problema aparece quando os animais decidem te perseguir e morder nas estradas de terra. Vejo muitas situações desagradáveis quando corro ou pedalo. Um bom programa de castração e adoção de cães e gatos poderia ajudar a resolver o problema. Talvez, uma lei obrigado o dono do animal a castrá-lo, com punição financeira para quem não o fizesse, poderia ser um impulso para resolver o problema. Apesar da atuação da Bicho Amigo, o problema é muito grande e difícil de resolver.

Lixo nas estradas de terra. Escrevi recentemente sobre a quantidade de lixo que encontro nas estradas de terra. Na maioria das vezes, durante meus exercícios eu encontro latinhas de cerveja, garrafas plásticas de água e coisas assim. Mas, há lugares onde há toneladas de lixo, restos de construção, sofás, animais mortos e descartados ali… uma tristeza. Campanhas de conscientização e multas pesadas, talvez ajudem a melhorar a situação. A estradinha de terra entre a Avenida Dr. Roberto Queiroz e a Estrada do Pica Pau sempre me deixa triste, pois há dezenas de pontos com muito lixo…

Parabéns, Bom Despacho!

Não é todos os dias que se faz 110 anos. Hoje, Bom Despacho tem exatamente o dobro de minha idade, mas ainda é uma criança. Que continue esta cidade acolhedora, com essa gente maravilhosa, simpática, trabalhadora e cheia de sonhos. Que preserve suas tradições! Parabéns, Bom Despacho e povo bom-despachense! Que eu possa comemorar muitos aniversários seus nas próximas décadas!

Alexandre Magalhães

Alexandre Sanches Magalhães é empresário, consultor e professor de marketing, mestre e doutor pela USP e apaixonado por SP e BD

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