Às mulheres, tudo o que sonharem ser

PAULO HENRIQUE ALVES ARAÚJO – Quando eu era moleque em Bom Despacho, lembro-me da lista de tarefas de casa que ficava afixada atrás da porta da cozinha. Não estou falando das tarefas escolares, essas aí tinham seu horário reservado nos nossos dias também. Estou falando de tarefas do lar mesmo: lavar a louça, lavar banheiro, varrer e passar pano na casa, varrer o quintal, aguar as plantas no jardim, estender a roupa no varal. Salvo engano, acho que só nos escapavam fazer a comida e passar a roupa, e creio que pelos riscos de acidentes… No mais, eu, meu irmão e minha irmã tínhamos, os três, tarefas na proporção de nossas idades, sem distinção qualquer de sexo.

Não, não era minha irmã que tinha que ajudar minha mãe a cuidar da casa. Todos tínhamos que fazê-lo. Minha mãe acreditava (e nos dizia com frequência) que era importante sabermos cuidar de nossa casa, de nosso espaço, sermos independentes. Todos tínhamos também que buscar nossos sonhos e deixar nossas companheiras e companheiros sonharem e desenvolverem o melhor de si, independente de gênero. Ela não queria que sua filha fosse uma mulher submissa e subserviente, e muito menos que seus filhos fossem machistas opressores. Respeito e igualdade no direito de sonhar eram reforçados dia a dia.

Infelizmente, ainda vivemos em uma sociedade de maioria machista. Entristecem-me histórias como a de Ninha, empregada doméstica que trabalha em nossa casa há anos, que cuida de 4 filhos, com extremo esmero, enquanto o pai (e marido?) foi ganhar a vida no Norte do país.

Ou a da jovem de Bom Despacho que conheci durante a campanha eleitoral no ano passado, sofrendo a dúvida se ajudava novamente o pai de sua filha de 3 anos, seu agressor condenado, a se tratar do vício em drogas. Ou as tabelas de salários de mercado que mostram que as mulheres ganham, em média, 30% menos do que os homens nos mesmos postos de trabalho.

Não defendo que homens e mulheres são iguais. Não somos. Em geral, a maternidade gera uma conexão mais profunda que a paternidade, por exemplo. Mas isso não significa que a mãe tem obrigação com os filhos enquanto o pai pode escolher “ganhar” ou “perder” sua vida de forma inconsequente. Minha esposa cozinha melhor do que eu, mas isso não quer dizer que apenas ela tenha que se desdobrar para ter uma vida pessoal e profissional além de ser a “rainha do lar”. Cada um tem sua vida pessoal e profissional, seus sonhos e suas obrigações.

Precisamos seguir caminhando para uma sociedade em que homens e mulheres tenham as mesmas oportunidades de fazer suas escolhas. Isso passa por dividirmos nossas obrigações do lar, por dar a ambos a mesma disponibilidade de tempo para estudar e desenvolver suas carreiras e relações pessoais, por valorizarmos nossos talentos masculinos e femininos com a mesma confiança e a mesma remuneração. Remuneração sim, cara pálida, não podemos ficar apenas sofismando, precisamos de mudanças concretas. E, falando em escolhas, precisamos respeitar inclusive o direito de homem ou mulher escolher ser uma “pessoa do lar”, ser o(a) cuidador(a) da família. Escolher é muito diferente de ser obrigado a fazer…

Mas há histórias recentes que nos mostram que Bom Despacho caminha para um maior equilíbrio de oportunidades. Na eleição municipal recente, por exemplo, tivemos uma candidata a prefeita que por pouco não se tornou a primeira mulher a ocupar o cargo na cidade, e tivemos outra grande mulher eleita como vice-prefeita. Tivemos novamente 3 vereadoras eleitas (33%), participação que, se ainda não é proporcional à população feminina de BD, é muito maior que os números observados em outras cidades e no próprio Congresso Nacional, onde se comemorou a marca de 10% de cadeiras ocupadas por mulheres na Câmara dos Deputados. Ah, e claro, temos novamente uma mulher presidindo a Câmara de Vereadores. Juliana, Keké, Sâmara e Sildete nos representam no poder público municipal.

Chama atenção também o crescimento de empresas lideradas por mulheres em Bom Despacho. Desde empreendedoras tradicionais, como a Marlene (da Panolli), até algumas com empreendimentos mais recentes, como Aline (da Cassis Comunicação) e Juliana (do Espaço Juliana Knischewski), passando pela Rose (da Citrovan), as bom-despachenses têm se destacado também nos negócios no município.

Existem ainda motivos para um Dia Internacional da Mulher que nos lembre que vocês têm o direito, como os homens, de oportunidades para serem as mulheres que sonharem ser. Mas há também motivos para celebrar que nossa sociedade tem caminhado e que pessoas maravilhosas como vocês tenham os espaços e a realização que merecem.

Se me dão licença, hora de dar um pulo ali na cozinha. O jantar é meu hoje… 😊

Feliz Dia Internacional das Mulheres! Tudibomprocês!

Paulo Henrique Alves Araújo

Paulo Henrique Alves Araújo é gestor e servidor público, mestre em computação e gerente de projetos de inovação

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *