Esse gato ainda vai me matar

ALEXANDRE MAGALHÃES – Para quem ainda não sabe o que é o Gato de Schrödinger: no dia 2 de julho, aqui mesmo neste espaço no Jornal de Negócios, relatei minha angústia de ter tido contato com um parente de minha namorada que estava com a covid-19. Comparei os dias pré-teste do novo coronavírus ao experimento científico do físico Erwin Schrödinger. Para quem não leu ou não lembra da explicação, repito-a para que todos possam entender minha angústia.

Há alguns anos eu assisti a um episódio da série norte-americana The Big Bang Theory, uma obra sobre jovens cientistas ligados ao estudo da física, no qual era apresentada a teoria do Gato de Schrödinger. O Gato de Schrödinger é um paradoxo, pois há um gato fechado em uma caixa, de forma a não estar apenas vivo ou apenas morto, mas vivo e morto.

Esse paradoxo é uma experiência mental desenvolvida pelo físico austríaco Erwin Schrödinger, em 1935. A experiência procura ilustrar a interpretação de Copenhague da mecânica quântica, imaginando-a aplicada a objetos do dia-a-dia.  Enquanto alguém não abrir a caixa, o gato estará vivo e morto ao mesmo tempo. Abrir a caixa, e só isso, pode resolver o paradoxo, deixando claro se o gato está vivo ou morto.

Pois é, por que mencionar novamente esse pobre gato? Ninguém vai acreditar, mas terei de fazer o teste de covid-19 de novo. Inacreditável!

No dia 20 de janeiro, eu tive a brilhante ideia de sair para jantar. Convidei minha namorada bom-despachense, que aceitou o convite, e saímos de carro para procurar algum restaurante aberto na cidade. Percorremos algumas ruas, passamos pelo restaurante “japonês”, que estava fechado, passamos pelo Kampala, que também estava fechado e vimos que o KiMassa estava aberto. Estacionamos o carro. Antes de descermos, eu tive a brilhante ideia de visitar a tia de minha namorada bom-despachense, que mora nos arredores do restaurante. Uma tia que adoro, pois é alegre, de bem com a vida, sempre me deixando de alto astral. Fomos até a casa da tia de minha namorada bom-despachense.

Ficamos lá uma meia hora. Encontramos a tia, o tio, seus dois filhos. Conversamos muito, sempre de máscara, menos no momento em que eles nos serviram uma bebida, uma cerveja. Conversamos com todos, especialmente com a tia e um dos filhos.

Hoje, para minha tristeza, ficamos sabendo que a tia de minha namorada bom-despachense está com covid-19. Fiquei arrependido até o último fio de cabelo, que não tenho mais, de ter ido visitá-la. Fiquei trinta minutos sentado no sofá, sem qualquer movimento, tentando entender por que o gato de Schrödinger me persegue tão fortemente. O que eu fiz a esse gato? O que eu fiz aos gatos em geral para que me persigam assim?

Depois de algumas horas, quase aos prantos, olhei bem no fundo dos olhos de minha namorada bom-despachense, e disse: “PQP, vamos fazer esse exame novamente”. Eu não aguento mais fazer esse exame. Não aguento mais encontrar esse gato. Não aguento mais viver nesse mundo. Vacina! Vacina! Vacina!, por favor!

Acho que vou ficar embaixo da mesa até dezembro de 2021!

No momento em que escrevo, estou olhando umas fotos do aniversário de quinze anos de minha filha, nas quais vejo minha namorada, sua filha, minha filha e muita gente mais. Isso foi em 2019, antes da pandemia. Aglomeração! Uma lágrima insiste em rolar por minha face. Que saudade desse mundo no qual tudo era permitido. Que saudade!

Gastamos uma hora ligando para as pessoas que tiveram contato conosco para avisar sobre a possibilidade de o Gato de Schrödinger estar nas redondezas.

Uma das pessoas está com febre. Medo! Fomos nós que passamos a doença? Mas, nem sabemos se estamos com a doença. Que estresse! Que neurose!

Começamos a preparar o dia de amanhã. Minha namorada não vai a seu trabalho. Eu posso trabalhar normalmente, já que estou atuando por meio do computador. Dispensamos a cozinheira e a faxineira. Avisamos a meu sogro e sogra para que não apareçam aqui em hipótese alguma.

Não aparecerei na academia, nem na lotérica, nem tomarei café no Na Praça Lanches, nem comprarei um picolé no Xuá, coisa que faço só para cumprimentar o seu Tarcisio, caixa no local e que adora conversar sobre Bom Despacho. Imaginem se eu contaminar essas pessoas que gosto!

Liguei para minha mãe e irmãos, que estão em São Paulo. Avisei que farei meu terceiro exame. Como bons paulistanos, eles se preocuparam com os gastos com os exames e não com minha saúde. Rio sozinho, pois é assim que pensa um paulistano. Agora que sou meio bom-despachense, vejo as diferenças.

Corri à vendinha mais próxima e comprei veneno para gato. Joguei o veneno ao redor da casa de minha namorada bom-despachense e vou ficar de guarda para ver se o gato de Schrödinger aparece. Adoro animais, mas esse gato eu quero matá-lo a pau. E ainda vou vender sua pele para tamborim, tentando recuperar uma parte de meus gastos com os exames de covid-19.

Estou ficando estressado com essa situação.

Agora são 21 horas e 21 minutos do dia 21, do ano 21 e do século 21. Espero que isso seja um sinal de sorte para o mundo. E para mim também.

Perdão, raro leitor e rara leitora, por voltar ao tema do Gato de Schrödinger, mas é que hoje eu quero, com diria minha mãe, “morrer de catapora”.

Que venha a vacina! E! rápido! Miau…

Alexandre Magalhães

Alexandre Sanches Magalhães é empresário, consultor e professor de marketing, mestre e doutor pela USP e apaixonado por SP e BD

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