Adeus, amigo Ivan. Já sinto a sua falta
Na minha idade, eu já deveria ter me acostumado com a ideia de perder amigos. Despedir-se para sempre de mais um deles poderia ser um ato banal. Contudo, não é. Nunca foi. Menos ainda quando este amigo se chamava Ivan. Ivan de Oliveira Araújo. Ivan foi um grande bom-despachense por adoção e um amigo de todos os momentos. Para falar dele, que palavras podem nos valer nestas horas tristes?
FERNANDO CABRAL – Ivan era também conhecido como Ivan do Posto Rodão, ou Ivan da Brasmatec. Ele tinha uma fábrica de calçados em Nova Serrava e uma fazenda em Araújos, onde plantava árvores. Gostava.
Empresário criativo e multifacetário, Ivan era luzense de nascimento, mas bom-despachense por escolha. Adotou Bom Despacho para trabalhar, investir, viver e criar família.
Inquieto, cheio de energia e de ideias, não se limitou a cuidar de seus empreendimentos e sua família. Juntou forças com outros empresários para soerguer a Acibom, criar a Credesp e lançar as bases do que veio a ser a Rádio Ativa. Por um breve período foi também secretário municipal. E nunca descurou dos assuntos de interesse de nossa cidade.
Ultimamente vinha tocando a Lanchonete na Praça, seu mais recente empreendimento. Como ele costumava dizer, um empreendimento não para ganhar dinheiro, mas para tirá-lo da aposentadoria. Ali – dizia ele – era um bom lugar para encontrar os amigos, conversar e acompanhar a vida social e política de cidade. Era assim mesmo. Ultimamente, era lá que eu costumava encontrá-lo para conversar.
A morte dele me pegou de surpresa. Acho que nos pegou a todos de surpresa. Afinal, ele estava sempre ativo, alegre e envolvido com ideias novas. Não havia nada que pudesse indicar algum problema de saúde. Duas, três vezes por semana eu parava na lanchonete para uma conversa. Atencioso com todos, ele se dividia entre o balcão, o caixa e uma conversa mais alongada com um e outro.
Ivan conhecia a maioria dos fregueses e se esmerava em atender a todos pessoalmente. Sempre dava um pouco de atenção a cada um, e a cada um entregava um sorriso afável. Mas não dispensava uma boa conversa também com os clientes eventuais. Viajantes que paravam na lanchonete para almoçar, ou talvez para pedir alguma informação sobre a cidade.
É assim que os fregueses se lembrarão do Ivan: rosto alegre, sorriso acolhedor, ouvidos atentos.
Na vida privada Ivan não era diferente. Sempre generoso e cordial, gostava de receber os amigos para um churrasco ou jantar, sempre acompanhados de um uísque single malt – sua bebida preferida.
Nestas ocasiões entrava em cena sua companheira da vida toda, a Cleuza.
Cleuza e Ivan eram anfitriões perfeitos. Ela cuidava dos mínimos detalhes da mesa e dos deliciosos quitutes. A estética refinada acompanhava e combinava com os pratos saborosos.
Mas, o triste inesperado estava para acontecer. Sem ser notado, um tumor silencioso vinha se instalando na coluna do Ivan. Quando ele se manifestou, a situação estava gravíssima. Os médicos fizeram às pressas uma delicada cirurgia. Duas, na verdade. Ivan não resistiu. Foram apenas umas poucas semanas entre a descoberta da doença e o passamento do nosso amigo.
Isto me deixou com o coração pesado. Estou triste. A perda deste amigo deixou um vazio imenso. Não apenas para mim, mas para todos que o conheciam.
Não é fácil dizer adeus, especialmente para alguém que tinha tanta vitalidade e tantos sonhos a realizar.
Ivan deixa mulher, filhos e netos, pessoas a quem tanto amava. Um lar formado com afeto e carinho. Sua família era seu orgulho. Falava de todos com satisfação. Queria cuidar de todos o tempo todo.
Ele deixa também muitos amigos. Gente que conviveu com ele em momentos de dificuldades e em momentos de celebrações.
Suas realizações — tanto no campo profissional quanto nas contribuições à comunidade — são um importante legado para Bom Despacho. Com seu talento, sua visão e sua ética de trabalho, ele inspirou muita gente e trouxe benefícios para todos. Construiu. Deixou sua marca.
Contudo, não podemos medir o legado do Ivan apenas pelos projetos que empreendeu e pelas realizações tangíveis que deixou. Temos que medir seu legado, principalmente, pelos laços de amizade que construiu, pelo entusiasmo que comunicou a outros, pelas mãos que estendeu a tantos que precisavam.
É por tudo isto que senti a morte do Ivan de forma tão profunda.
Mas, ao lado deste sentimento de perda de um amigo, tenho também o sentimento de gratidão por ter tido a oportunidade de conviver com ele, compartilhar ideias, discutir projetos.
Na minha idade, a notícia da morte de um amigo não é novidade. A certeza da nossa própria morte é absoluta e inafastável. Mas quando ela nos pega de surpresa, ficamos com a impressão de que havia conversas a terminar, mas que nunca terminarão. Não tivemos tempo. Nunca mais teremos.
A Cleuza – sua companheira de quase meio século – seus filhos, netos, todos passam por uma dor que não podemos nem mesmo imaginar. Mas cada um deles poderá ter o conforto de saber que Ivan se orgulhava de cada um deles e que tudo fazia para vê-los felizes e realizados. Sua ausência é irreparável, mas o exemplo que deixou poderá guiar e inspirar a todos a cada dia.
Adeus, meu amigo. Sentiremos sua falta. Sentiremos falta do seu sorriso, das nossas conversas, dos nossos sonhos trocados. Que você possa descansar em paz, com a certeza de que ajudou a construir uma cidade melhor com suas contribuições tangíveis e intangíveis.
Como disse Milton Nascimento, “Amigo é coisa para se guardar debaixo de sete chaves, dentro do coração”. É lá que você está e continuará vivendo. (Portal iBOM / Fernando Cabral é licenciado em Ciências Biológicas, advogado, auditor federal e ex-prefeito de Bom Despacho / Fotos: Arquivo família).