Alquimia da menopausa: o corpo desvanece, a alma brilha
ROBERTA GONTIJO TEIXEIRA – Talvez soe um tanto egocêntrico escrever na primeira pessoa, mas há momentos da vida em que compartilhar vivências não é só uma escolha, é necessidade. Seja em longas conversas, nas redes sociais ou neste espaço do jornal. Senti vontade de dividir o que tenho vivido.
Nos últimos meses, venho atravessando uma fase peculiar: a pré-menopausa. Entendi que esse é um período que se apresenta de maneira única para cada mulher. Ainda que existam sintomas comuns — como os famosos calorões, oscilações de humor, insônia, zumbidos, confusão mental, tonturas e perda de libido — a forma como cada corpo e mente reagem é absolutamente singular. Algumas têm, inclusive, a sorte de atravessar o processo em brancas nuvens.
Mas, aos poucos, quando as descobertas vão se aclarando, descobrimos que o que parecia apenas doença, exaustão e ansiedade é, na verdade, um chamado anunciando mudanças profundas e o nascimento de um novo ser.
Demorei a entender que os sintomas que me acometiam não estavam isolados, mas sim interligados por esse fio invisível que marca o início de uma nova fase hormonal. Quando finalmente compreendi, senti que era quase um tema de saúde pública. É urgente que todas as mulheres nessa faixa etária tenham acesso a informações claras, acolhimento médico qualificado e diferentes possibilidades de tratamento.
Confesso que estou assustada, que senti e ainda estou sentindo muitas coisas diferentes. Andei um pouco desnorteada. Tenho vivido o peso da exaustão e cogitei desacelerar, diminuir as tarefas diárias e escutar meu corpo.
Esse movimento de escuta e acolhimento é essencial: respeitar o processo, entender e, por quê não, saborear.
Estou me informando, fazendo exames, conversando com especialistas, lendo e ouvindo relatos de outras mulheres. E o que percebi foi que não existe um único caminho. Cada uma atravessa como pode e como se sente melhor
Há quem opte pela reposição hormonal. Outras buscam mudanças na alimentação, intensificam a atividade física ou simplesmente se recolhem, num gesto silencioso de autoacolhimento, para viver essa metamorfose em seu próprio tempo.
Eu escolhi aceitar e aprender com as transformações. Estou indo devagar, um passo assustado de cada vez.
Minha médica nomeia esse período como “menoscência” — uma espécie de adolescência da maturidade. E, de fato, é uma fase muito diferente de tudo que vivi até aqui. O corpo parece falar uma nova língua, que ainda não compreendo totalmente. Pede mais descanso, exige mais atenção. Passa a roubar energia das tarefas cotidianas e exige que eu olhe para ele com mais cuidado, escuta e respeito.
Como em toda transformação, há beleza no processo. Uma beleza estranha e profunda. Há força na vulnerabilidade. E aprender a viver essa etapa como um renascimento pode ser a chave para atravessá-la. Trata-se, afinal, da ponte que me levará à velhice (assim espero). Não como um fim, mas como o auge de um processo de evolução, como bem me disse outro dia um neurologista.
Ele me fez um delicado convite, o de encarar o processo de envelhecer não como uma tarefa árdua, mas como um desafio encantando, onde o corpo se desvanece para a alma brilhar. Achei lindo.
E assim, me propus, paradoxalmente, transformar o fim do ciclo reprodutivo num renascimento da alma, numa chance de ser quem realmente sou, de me acolher, usar meu tempo para mim e me desapegar, ainda mais, de amarras e rótulos, exigências e expectativas externas.
Que possamos encontrar formas suaves, interessantes e generosas de fazer essa travessia. Que ela seja feita com afeto, aprendizado e coragem. Porque, no fim, a poesia da vida não está apenas no que parte, mas, sobretudo, no que permanece, no que foi aprendido, no amadurecimento, na sabedoria de quem já errou e acertou, na coragem de quem topou fazer a travessia e, acima de tudo, na beleza de continuarmos vivos e cheios de possibilidades. (iBOM / Roberta Gontijo Teixeira é bacharel em Direito e servidora pública federal).