Duro na queda!

 

DILERMANDO CARDOSO – O sujeito se forma e consegue trabalho numa grande empresa, ou aprovado em concurso ocupa cargo público, e daí se casa, tem filhos… Então, comete seu pecado mortal. Não, maldoso leitor, ele não troca a esposa de quarenta anos por duas namoradas de vinte, não! O inocente compra uma chácara. Ainda entusiasmado, constrói lá bela casa — melhor de que a sua na cidade — com varanda, piscina, churrasqueira para receber os amigos do truco, ou as rodas de violeiros nos finais de semana. Até um pomar, com plantas exóticas, cisma cultivar. Como dizia o Pacau: “Desgraça pouca é bobagem!”.

Não sou e nem me acho mais esperto do que ninguém. Por isto confesso humildemente: também cometi este pecado! A certa altura da vida comprei um sítio. Pé no chão, todavia, levantei uma casinha simples – sala, quarto e cozinha —, nada de piscina ou churrasqueira; mas cercada por mangueiras, abacateiros, jabuticabeiras…

Embora o final do ano tenha sido ruim de chuvas, um pé de jabuticaba no quintal do meu sítio, em agradecimento aos borrifos das nuvens, cobriu-se de flores — do tronco às pontas das galhas. Logo vieram os frutos: gostosos como lua de mel… Achei que era um desaforo, e aventureiro resolvi disputar as tais frutas com abelhas e marimbondos que infestavam a jabuticabeira. Em pouco prazo, o balde que levei para a colheita estava cheio! Mas aí, como sempre ocorre a quem possui o olho maior do que a barriga, uma vozinha insinuante sussurrou ao meu ouvido: “As melhores jabuticabas ficam nos galhos mais altos!”. Sem pensar duas vezes peguei uma escada metálica, destas que se abrem na forma da letra vê invertida, e subi.

No instante em que coloquei os pés no último degrau, a maldita escada se fechou e eu caí — igual um saco de batatas —, me esparramando de costas no chão. Pela proteção de algum anjo extraviado que passava por lá, não bati a cabeça; ou não estaria aqui contando esta desventura. De repente, minhas vistas escureceram, perdi o fôlego, e a última coisa de que me recordo foi dar um gemido: “Me lasquei!”. Quando novamente tomei consciência das coisas, continuava espichado no quintal, zonzo como se houvesse enxugado meia garrafa de Caninha do Picão!

Socorrido, após tomografias, ressonâncias e fisioterapias sobrevivi inteiro. Dei sorte! Caso batesse as botas no sítio o vexame ia ser maior. Porque conhecendo os amigos que tenho, certamente algum deles, depois de abusar das louras geladas no Bar do Chen, compareceria ao velório para se despedir de mim, debochando: “É como se diz — hic! hic! —, bobo e buraco de estrada não se acabam nunca. Qualquer sacolão em Bom Despacho vende jabuticaba — hic! hic! —”. (Portal iBOM / Dilermando Cardoso é bancário aposentado e escritor / Imagem ilustrativa feita com IA).

 

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