Filhos que fazem papel de pais dos Pais

 

ROBERTA GONTIJO TEIXEIRA – No último domingo, um dos eventos realizados na festa do Engenho foi uma corrida de rua. Fui, levei meu pai, reencontrei muitos amigos queridos. Mas um bate-papo me chamou particular atenção.

Eu e o Haroldo Assunção, filho do Célio Honório e da Dona Luzia, somos amigos de infância. Com um grande grupo, estudamos por anos na mesma sala. Frequentávamos as casas uns dos outros e nos tornamos uma grande família.

Naquele dia relembramos a nossa história. Falamos sobre o orgulho e o privilégio de termos Pais tão dedicados, vivos e ativos. Haroldo me mostrou uma foto linda dos pais dele dentro da Igrejinha do Engenho e fui tomada por grande emoção.

Eu, como o Haroldo e, tenho certeza, inúmeros outros brasileiros, tivemos a sorte de ter nossos pais nos amparando e construindo um forte alicerce para que pudéssemos nos desenvolver e aproveitar o melhor dessa vida. Cada núcleo familiar na sua proporção, dentro de suas possibilidades e utilizando as ferramentas disponíveis.

Por causa do acesso à informação, o avanço da medicina, a alimentação saudável e a prática regular da atividade física, fazemos parte de uma nova geração. Temos 40/50/60 anos e ainda estamos cheios de sonhos, planos, projetos e com uma boa perspectiva de vida pela frente. Somos mais longevos.

Em decorrência dessa longevidade, tanto nossa, quanto dos nossos pais, estamos tendo, hoje, o privilégio de viver o papel paterno invertido.
Em diversas famílias e ocasiões, os filhos passaram a exercer o papel de Pais dos pais. O que muitas vezes, concordo, pode assustar e nos deixar um pouco inertes, perdidos e até exaustos.

Agora, são eles que dependem, em várias circunstâncias, da nossa atenção, do nosso cuidado, do nosso olhar. Mas não é só isso. Estamos tendo, também, a possibilidade de curti-los, mostrar-lhes a vida e levá-los a lugares que não tiveram a oportunidade de conhecer.

Não estou pretendendo apenas romantizar tudo isso. Sei que nem sempre é uma tarefa fácil e só prazerosa. Ela inclui toda uma logística, dedicação, exercício, abdicação e, para alguns, até um certo malabarismo. Até por que, neste caso, a perspectiva é diferente. Não cuidaremos deles para que se tornem cada vez mais autônomos e independentes, como fizeram conosco. Ao revés, o envelhecimento é implacável e irreversível.

Claro que é normal sentirmos o peso de lidar com os remédios, as consultas, as deficiências físicas recém-adquiridas, ou mesmo a dor de vê-los perder a cognição e/ou a capacidade física. Sei também que, em alguns momentos, é angustiante precisar abrir mão do próprio tempo tão corrido e comprometido.

Mas, indubitavelmente, é preciso olhar e agradecer a beleza de viver esse momento. Ter nossos pais por perto, poder curtir a vida com eles, retribuir um pouco do muito que fizeram. Conduzi-los e ampará-los em direção à velhice, estar com eles de mãos dadas e poder dizer: estou aqui, não precisa ter medo. Como faziam conosco nas nossas transições e ao zelarem por nossos medos.

Outro dia uma amiga me contou uma história comovente. Perguntaram a uma profissional da ciência o que ela achava ser um fato histórico marcante para a humanidade. Esperavam que a resposta fosse a invenção do fogo ou da roda. Para espanto de todos, ela disse ser o momento em que os nômades, em vez de abandonarem seus deficientes, doentes e idosos por serem um peso, passaram a fixar morada para ampará-los e deles cuidar.

Que possamos suavizar nossos processos e compreender que a vida nada mais é do que travessia e amparo. Não há nada tão precioso quanto a beleza da convivência e do cuidado com o outro. Particularmente quando esses outros são os nossos pais.
Feliz dias dos pais a todos que, de alguma forma, hoje ocupam esta posição. Nesse dia especial, meu abraço carinhoso para alguns pais que me cercam.  (Portal iBOM / Roberta Gontijo Teixeira / Fotos: arquivos de família).

 

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