Um veterinário e seu amor pelos animais
Por dias a chuva castigou o Rio Grande do Sul. A enchente diluviana instaurou o caos. A tragédia se alastrou. Quase duzentas pessoas morreram. Dezenas estão desaparecidas. Perto de um milhão perdeu tudo: casas, móveis, carros, roupas, utensílios. Milhares, talvez milhões, perderam seus empregos. Não se sabe ao certo quantos estão vivendo em casa de parentes e amigos. Próximo de cem mil estão vivendo em abrigos improvisados em escolas e estádios. Porto Alegre ficou sob a água. De onde ela refluiu restaram escombros, lama, desolação. Este é o cenário da maior catástrofe ambiental e humana de que se tem notícia no Brasil. Cenário dantesco.
FERNANDO CABRAL – Em meio à calamidade apocalíptica, uma força humana se elevou bem alta para enfrentar a força da natureza: a solidariedade. O Brasil se uniu inteiro em torno do propósito de minimizar o sofrimento dos que perderam tudo. Em poucas horas nasceu um movimento para levar aos gaúchos tudo que eles mais precisam neste momento: água, comida, agasalho, medicamentos, dinheiro para recomeçarem a vida. Tudo embrulhado em duas palavras que definem o que o ser humano tem de melhor: compaixão e solidariedade.
As coisas materiais são necessárias e chegam em boa hora. Mas o que se vê por trás delas é de beleza comovente: o amor desprendido para com os que sofrem e necessitam. Mais do que uma garrafa d’água, uma blusa de frio, uma cesta de alimentos, o que os brasileiros estão dando aos gaúchos é simpatia, é carinho, é amor. Este gesto de amizade dá a todo brasileiro a certeza de que, em caso de necessidade, jamais lhe faltará a mão amiga dos seus patrícios.
Mas há uma coisa ainda mais necessária do que os gêneros de primeira necessidade. É o trabalho, a dedicação pessoal. Em meio a dificuldades tão grandes, faltam bombeiros, médicas, enfermeiros, motoristas, veterinários.
Sim, veterinários, porque são muitos milhares de animais em sofrimento. São animais extraviados e famintos; animais que se feriram com as enchentes ou que adoeceram devido à contaminação das águas. São animais que também precisam da solidariedade humana.
Esta necessidade tocou o coração do veterinário bom-despachense Evandro Paulinelli, o Popô. Enternecido, saiu de sua casa no bairro Jardim América e foi parar em Canoas, no Rio Grande do Sul. Lá, juntou-se às equipes de veterinários, voluntários e bombeiros e ajudou a resgatar mais de 300 gatos e cachorros presos em casas e apartamentos, ilhados em telhados, agarrados a galhos de árvores.
O tempo que lá ficou, abrigou-se na casa de uma moradora que acolheu quatro voluntários. Segundo relatou ao IBOM, na casa não havia água encanada. Banho, só de cuia. Não havia como cozinhar. A comida lhes era fornecida por moradores. Chegavam em marmitas. Coisas simples, mas tinham o rico sabor da gratidão de quem a preparava.
Emocionado, Popô descreveu a calamidade que jamais havia pensado ver: tudo coberto pela água, mau cheiro, corpos de gente e de animais. CLIQUE AQUI e veja a entrevista dada por Popô ao iBOM.
Trabalhando ininterruptamente por dez dias, ele perdeu a conta de quantas cirurgias fez, quantas feridas tratou, quantos animais acalmou e salvou.
Animais não falam, mas se comunicam. Por isto podemos entender quando Popô diz que eles pareciam pedir socorro. Quem vive com animais reconhece o olhar de desespero que nos lançam quando estão em dificuldade e a cara de gratidão que fazem quando são socorridos.
Quem pode duvidar de que realmente pediam socorro? Sozinhos, entregues à própria sorte, a morte seria quase certa. Mas Popô, assim como milhares de voluntários que foram ao Rio Grande do Sul, se tornou um farol de esperança para pessoas e animais no meio da calamidade.
Bom Despacho arrecadou água, comida, roupa e dinheiro para os gaúchos. Mas a solidariedade mostrada por Popô, com seu envolvimento pessoal, nos dá orgulho e nos manda uma lição universal: nós, humanos, temos uma alma e um coração gigantes. Quando eles se tocam e comandam, nós podemos fazer coisas maravilhosas.
Popô deve ter sentido uma profunda mudança interior pela solidariedade que prestou a tantos bichinhos que estavam vivendo momentos de grande sofrimento. A compaixão que ele mostrou revela que, a despeito de tantos extravios, no fundo, nossa essência, a essência do ser humano, é o amor ao próximo e aos animais.
Popô merece nosso reconhecimento. Seu amor pelos animais, sua compaixão perante o sofrimento, são exemplos para todos nós. (Portal iBOM / Fernando Cabral é licenciado em Ciências Biológicas, advogado, auditor federal e ex-prefeito de Bom Despacho / Fotos: arquivo Popô Veterinário).