Itamar Brasinha e sua obra sobre Hélio Garcia
A obra do escritor bom-despachense remete à arte mineira de fazer política que está, ao mesmo tempo, tão longe e tão perto de nós
LÚCIO EMÍLIO – Itamar “Brasinha” é um de nossos grandes escritores. Jornalista, estudou em Paris, lecionou na UFMG, escreveu vários livros, é grande a sua trajetória. Jacinto Guerra escrevia sobre ele com admiração. Brasinha tem uma obra sobre Bom Despacho: Bom Despacho que Te Quero Bom: Fragmentos de um Painel Político. O livro saiu pela editora O Lutador em 1987.
Brasinha foi vereador em Bom Despacho, secretário da Indústria e Comércio de Belo Horizonte e presidente da Fundação Ulysses Guimarães. Itamar também é autor das biografias de João Bosco Murta Lages, Manoel Cunegundes e Ronan Tito. Também pesquisou a trajetória da PucMinas, por ocasião de seus cinquenta anos, vindo a lançar “O Sonho é Possível” em 2008.
Recentemente, Brasinha escreveu uma biografia do governador Hélio Garcia (1906-2015). Essa biografia me dá a curiosa impressão de um tempo “tão longe, tão perto”. Tão perto de nós no tempo, mas ao mesmo tempo longe, pois a atualidade é muito diferente. Como estudante de Direito e político, Garcia vivia no “Chez Bastião”, no Minas Tênis Clube. Gostava de uísque e de festas, indo mesmo a inferninhos e lugares populares. Na atualidade, o perfil do executivo, bem como do estudante de Direito, é mais um gestor, um técnico. Não há mais espaço para boêmios chegarem ao alto escalão. Bom Despacho foi citada na biografia, o que dá medida do carinho que Brasinha dedica a Bom Despacho:
O bem contra o mal faz muito bem às elites. O bem contra o mal faz muito mal ao povo. Mas quem decide o que é o bem e o mal é o político. Filhos, netos e famílias governamentais da elite. É assim em qualquer lugar do mundo. Em Abaeté, Bom Despacho, em Dores do Indaiá, Lagoa da Prata, Pompéu e Bambuí não é diferente (GARCIA, 2022, p 90).
Igualmente, o tempo em que um líder como um governador tirava fotos com astros da MPB mineira como Hélio tirou ao lado de Milton Nascimento não ocorre mais. Ao lado de que astro da MPB local o governador posaria? Fernanda Takai? Paula Fernandes? Podemos dizer que sequer existe esse astro da MPB que é consensual.
Outro ponto que achei bastante destoante do momento atual é que o líder político do governo Hélio Garcia foi um comunista do atual PCB, o advogado Arutana Cobério Turuna. Cobério tinha muito pouco a ver com Hélio Garcia e disse que o político era golpista e corrupto, ao ser chamado para ser líder dele na Assembleia Legislativa. Foi uma conjuntura específica da redemocratização e uma tentativa de Tancredo Neves de fazer uma reparação dos erros do passado, mas curiosamente creio que é uma circunstância que dificilmente irá se repetir. Tancredo Neves estava por trás da manobra. Ao agir assim, reparava as cassações de pessoas de esquerda no passado e conclamava todos a experimentar, de fato, a abertura democrática.
Arutana, de início, recusou-se a trabalhar junto a Hélio Garcia, que, segundo Brasinha, foi um dos articulares do golpe civil-militar de 1964 ao lado de Magalhães Pinto (que efetivamente foi um mentor político de Garcia).
Parafraseando o filme de Wim Wenders, a arte mineira de fazer política de Hélio Garcia está, ao mesmo tempo, tão longe e tão perto de nós.
(Portal iBOM / Lúcio Emílio Júnior é filósofo, professor e escritor / Foto: Arquivo).