Bar do Tonhão preserva a memória afetiva da cidade

VANDER ANDRÉ – Sempre que uma nova foto antiga é compartilhada nas redes sociais do Bar do Tonhão causa um alvoroço em Bom Despacho. Seus seguidores ampliam a imagem e, surpresos, tentam identificar as pessoas retratadas nas imagens desbotadas, esquecidas e agora expostas no feed de uma página do Facebook ou do Instagram. A pergunta paira no ar: será que essa pessoa é filho(a) ou pai(mãe) ou avô(avó) de quem? Da mesma forma, surge um dilema maior: afinal, quem é o Tonhão, que mexe com nossas memórias afetivas de forma tão peculiar?

Na semana passada, conversei com Willian, o idealizador do canal, quando ele compartilhou alguns segredos dessa história: Tonhão foi o primeiro marido da sua mãe, Maria das Graças, por quem ele tem um grande carinho. O famoso Bar do Tonhão fica localizado na Praça do Rosário, 5, atrás da Igreja católica. Já o nosso entrevistado, Willian Araújo, é filho de Maria das Graças e Pedro Perneira, irmão de Gilberto, Eliane, Edna, Gilmar, Pedro e Mariângela, casado com Atalita e pai do Pedro. Ele mora em Itaúna e mensalmente visita seus familiares em Bom Despacho. 

Willian nos contou que tomou gosto pela história e pelos personagens de Bom Despacho ouvindo os muitos causos do seu pai e lendo as colunas do seu primo Tadeu Araújo Teixeira, aqui mesmo no Jornal de Negócios.

Em 2012, durante o centenário de Bom Despacho, iniciou o seu trabalho com postagens de fotos antigas de Bom Despacho. A ideia inicial era divulgar 100 fotos em 100 dias culminando na comemoração do centenário da cidade em 1° de junho de 2012. Assim, ele reuniu várias fotos e as arquivou. Nessa época, um dos seus maiores incentivadores foi o professor Jacinto Guerra.

Sete anos depois, a ideia ressurgiu por meio de uma brincadeira de postar fotos de personagens que frequentavam o Bar do Tonhão. Para isso, ele desenvolveu uma nova página em 2019. A primeira publicação ocorreu em novembro de 2019, com uma montagem de frequentadores assíduos do Bar do Tonhão como Dedé, Caniggia, Tatu, Bigode, Cicão, Roberto, Carlos, Geraldinho, Testa, Jamir, Mariano, Lemão, Piu Piu, Corujão, Bibip. 

Após a primeira postagem, Willian passou a divulgar as fotos coletadas em 2012, percebendo um grande engajamento da população de Bom Despacho nas redes sociais. À medida que aumentavam seus seguidores, seu entusiasmo crescia, levando-o a publicar mais fotos, convidando a quem pudesse colaborar com o seu propósito a enviar fotos antigas de pessoas e lugares da cidade. O Bar do Tonhão Museu virtual tem atualmente mais de 9.700 seguidores ativos no Instagram e 9.200 amigos na rede social Facebook. 

Desde então, ele admitiu que vem sendo “bombardeado” diariamente com o envio de várias fotos. Apenas como referência, no dia da entrevista, ele informou que já foram publicadas 4.058 fotos e que recebe em média 5 fotos diárias, dos mais variados colaboradores. Além das fotos, suas redes sociais também publicam vídeos antigos. 

Quando questionei Willian se ele tinha alguma foto favorita que lhe chamou mais a atenção, ele confessou que há várias, mas que é especialmente “apegado” a uma foto de Bom Despacho de 1881, a foto mais antiga que já publicou. Ele obteve essa foto por meio de uma pesquisa na Biblioteca Nacional Digital, sob o nome “Uma vista photográfica da villa de Bom Despacho”. 

A identificação das pessoas e lugares nas fotos é um trabalho árduo e colaborativo, aproveitando a estratégia para envolver a comunidade, movimentando a rede e gerando engajamento. Atualmente, Willian tem contatos e fotos de quase todas as famílias de Bom Despacho, com as quais ele entra em contato para obter as informações para colocar na legenda. Quando ele não consegue, deixa para as pessoas comentarem e complementarem as informações. 

O perfil dos seguidores que mais curtem a sua página é das pessoas que têm acima de 30 anos de idade, e o número de curtidas depende muito da temática apresentada na imagem, o que denota a importância de divulgarmos bastante a sua experiência de forma a alcançar também os mais jovens, para que eles se sintam motivados a conhecerem e colaborarem para a preservação da memória dos seus antepassados. 

O maior fornecedor de imagens históricas de Bom Despacho para o Museu Virtual é o Zé Pedro do Foto da Vinci, de quem teve a permissão e escaneou todo o seu acervo no açougue da sua filha Irene. Além dele, Willian citou também Ivone Cardoso, Haroldo Daldegan, Bozó e Derli Camelo.

O museu não possui fotos em formato físico (em papel), apenas em formato digital, pois Willian escaneia tudo juntamente com os donos das fotos, não aceitando fotos físicas. Dessa forma, ele acredita e ri dessa possibilidade, ninguém vai dizer um dia: “Ah, o rapaz do Museu levou as fotos e talvez tenha esquecido de trazer algumas de volta…”. 

Infelizmente, o museu ainda não recebe apoio financeiro para sua manutenção, nem mesmo conta em sua equipe com profissional especialista em recursos audiovisuais, mas Willian diz que está aberto às propostas de parcerias e apoios ou patrocínios, seja do setor público ou de empresas da cidade, que permitiriam a expansão da ideia, transformando-a num grande acervo cultural, capaz de preservar a memória visual de Bom Despacho. Hoje ele faz tudo sozinho, coleta e edita as fotos, programa as postagens, responde as mensagens e procura informações sobre as fotos. A equipe, por enquanto, é composta somente por ele, o que lhe dá bastante trabalho, mas, que lhe faz bem e encara como uma “terapia”.

As fotos são publicadas com uma marca d’água, que apresenta a logomarca do Bar do Tonhão, criada por ele mesmo. Essa marca tem a única finalidade de identificar se a imagem já foi previamente postada. Por exemplo, se ele receber a foto de um colaborador que ele tenha postado em 2020 com a logo, aí ele já a descarta, pois já está arquivada. Além de deixar registrado de onde surgiu a foto. Importante ressaltar que a marca d’água não foi originalmente criada com o propósito apenas de identificação, mas, naturalmente, Willian tem interesse em criar uma versão mais profissional para o Museu, o que seria uma oportunidade incrível. Ele está aberto a contar com o apoio dos designers da nossa cidade para isso. 

Pensando no futuro, Willian confessa que, por enquanto, o museu existe apenas virtualmente e que ainda não dispõe de registros oficiais, estando tudo no seu próprio nome. No entanto, ele gostaria muito de ver o projeto em uma exposição presencial na cidade, o que também é muito significativo. Ele sonha em deixar um legado em uma plataforma web que possa arquivar de forma segura e para sempre essas histórias e personagens que hoje estão disponíveis apenas na rede social. Willian é otimista e espera que daqui a cinquenta anos as pessoas possam acessar esse arquivo na plataforma para pesquisar a história da nossa gente e do nosso espaço geográfico num site do Bar do Tonhão – versão web (esperamos que exista ainda!).

Emocionado, Willian nos conta episódios que lhe marcaram ao longo desses anos dedicados ao Museu Virtual e destaca as várias ligações e mensagens no Whatsapp agradecendo a divulgação, de várias formas. Algumas delas, segundo ele, comprovam que vale muito a pena o seu propósito, como por exemplo, quando uma filha lhe relatou, em prantos, a alegria de encontrar uma foto do seu pai, de quem não tinha ainda nenhum registro fotográfico até aquela data. 

O curador do Museu Virtual segue firme na sua missão, nos trazendo a cada dia mais oportunidades para aguçar nossa memória afetiva. Ele também espera conseguir algumas fotos que ainda hoje não estão disponíveis na sua rede, como, por exemplo, do Fiico (Bar na Avenida das Palmeiras), Cotinha, Lena doida, Alfredo do Raposo (seu avô), Construções da Igreja do Rosário e do Bairro de Fátima. 

As pessoas podem colaborar com o acervo do museu enviando material através do email willian.azaragata@gmail.com, pelo Whatsapp (37) 98826-2595 e ou pelo direct do Instagram que você acessa AQUI.

(Vander André Araújo é advogado, filósofo e escritor / Foto do alto: Willian (direita) com Dedé no Bar do Tonhão / Foto do texto: Willian Araújo, criador do canal)

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