Tadeu: o homem que espalha gentilezas

Tadeu: pai, professor, líder estudantil, ativista politico, defensor dos bichos e do meio ambiente, escritor, colunista deste jornal, historiador, membro atuante da comunidade, bom-despachense da gema

ROBERTA GONTIJO TEIXEIRA – Como a de todos nós, a história do meu pai foi marcada por erros, acertos, pecados, equívocos, lutas e belezas. Por muitas vezes já me peguei admirando-o, como também questionando seus comportamentos. Em inúmeras oportunidades o incompreendi, para logo em seguida me ver seguindo seus passos e agindo exatamente como ele.

Tive que aprender a lê-lo para entender melhor quem sou.

Então, de todas as coisas que poderia dizer sobre meu pai, vou ater-me ao que acho que o resume e ao que mais me encanta: o dom que ele carrega de olhar para o outro e espalhar gentilezas.

Tadeu Antônio de Araújo Teixeira, no curso desses 80 anos, passeou por essa vida com muitas restrições, mas completamente à vontade, sem cerimônias ou formalismos. Nunca se importou como estava se apresentando perante o outro, se o cabelo estava penteado, se a roupa estava de acordo ou se estava composto o suficiente para a ocasião.

Jamais conseguiu se ater às praticidades e objetividades cotidianas. Via de regra, não se lembra onde pôs a carteira, onde guardou o cartão, onde está dinheiro, a chave do carro. Às vezes, até as compras que fez no mercado ficam pra trás.

Por outro lado é mestre na arte de conviver, de se relacionar e enxergar quem está a seu lado. Sempre quer saber as histórias, as glórias, anseios e dificuldades alheias e, seja lá como for, ajudar. Ouve, acolhe e aprende com a narrativa de quem cruza o seu caminho. Depois transforma tudo em “causos”, artigos ou lindos textos.

Ele não sai por aí procurando tutelados ou fazendo caridade, simplesmente cumpre sua trajetória com um olhar atento ao outro ser humano, independente de quem seja.
Com todos, sem nenhum tipo de seletividade, bate um dedo de “prosa” e se deleita em horas de conversa.

Não importa se são seus irmãos, vizinhos, alunos, amigos ou simplesmente desconhecidos que cruzam com ele numa parte da travessia. Não importa que tenham 5 ou 80 anos, que sejam letrados ou analfabetos, ricos ou pobres. Ele os adora indistintamente, vê, ouve, compreende, acolhe e enxerga-lhes as qualidades.

Na minha opinião, não há forma mais louvável de gentileza.

Como tudo que se planta se colhe, ele hoje, aos 80 anos, segue vida afora colhendo as gentilezas que plantou.

Acometido pela Síndrome do Pânico por toda a vida, nos últimos anos vem se livrando do fardo e fazendo heroicas e emocionantes conquistas: conseguiu ver o mar pela primeira vez ao 76 anos; aos 77 assistiu ao seu primeiro jogo no Mineirão, uma vitória de 3×0 do Galo (uma de suas grandes paixões) sobre o Santos. Apenas aos 78 venceu o medo das alturas e fez sua primeira viagem de avião.

Em cada uma dessas conquistas arruma mil novos amigos, mil novas prosas e, como é de seu feitio, amplia o leque de gentilezas.

Eu sempre me emociono com as conquistas dele e vivo repetindo: pensa pai, você se curou a tempo de ver o mar! E ele, sem titubear, responde da mesma forma: ver o mar foi emocionante, mas não como entrar no Mineirão a primeira vez e ainda ver o galo ganhar de 3×0.

Apaixonado por Guimarães Rosa, desde que começou a livrar-se do fardo do pânico repete, quase que diariamente, a fala pinçada dos livros do escritor. Não lembro o teor exato, mas era algo do tipo “minha vida voltou a começar”.

Então, pai, que você ainda tenha muitos anos pela frente. Que a vida volte diariamente a recomeçar e você possa seguir mundo afora, ouvindo e contando casos, batendo papos, lendo livros, escrevendo textos, ajudando pessoas, aprendendo com elas, espalhando gentilezas e vendo o Galo ganhar. (Roberta Gontijo Teixeira é bacharel em Direito, ambientalista e servidora pública federal).

 

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