Carnaval chegou, Covid bombou
FERNANDO CABRAL – De julho a novembro de 2020 a incidência da COVID no Brasil caiu. De novembro para cá, voltou a subir. No Natal deu uma subida forte, depois se estabilizou no alto. Assim continuou até o carnaval. Dez dias depois do carnaval tivemos uma explosão de casos que está levando o sistema de saúde ao esgotamento. Os leitos de UTI praticamente se esgotaram em todos os estados. Em algumas cidades as filas de esperam chegam a centenas de pacientes. Para as próximas semanas não há solução à vista. Mais do que nunca vale a máxima: é melhor prevenir do que remediar.
Não é por acaso que se nota aumento de casos de coronavírus após as festividades. Foi o que aconteceu depois das festas de Natal e de Ano Novo. É o que está acontecendo agora, após o carnaval.
O fato é que, a despeito das recomendações das autoridades, os brasileiros continuam se aglomerando. Enquanto a vacina não se tornar uma realidade para todos, o afastamento social continuará sendo a melhor forma de evitar a propagação do vírus. Mas, infelizmente, o respeito a esta regra tem sido escasso. No carnaval e outras datas festivas, o desrespeito aumenta. Aí é só contar 10 ou 15 dias e observar o aumento dos casos e das mortes.
O aumento de casos não atinge somente aqueles que abusaram. Primeiro porque, por se tratar de epidemia, quanto mais casos temos, mais os casos aumentam. É um processo de bola de neve. É um crescimento exponencial. A doença se alastra com mais rapidez quando mais gente entra em contato umas com as outras.
Em segundo lugar porque a ocupação de leitos por pacientes com COVID prejudica a todos, não apenas os doentes com COVID. Isto pode ser constado facilmente em duas situações. Numa ponta, vemos aumento das filas de cirurgias eletivas. Na outra ponta, vemos aumento de mortes por pacientes que esperam por um leito de UTI.
O adiamento de cirurgias eletivas já é uma rotina desde o início do ano passado. As cirurgias não são feitas porque não há leitos. Tampouco há vagas de UTI para o caso de paciente operado precisar. Além disto, o próprio ritual da cirurgia aumenta o risco de o paciente pegar o vírus e complicar sua situação.
Tragédia
Dia 25 de fevereiro de 2021 o Brasil registrou 1.541 mortes por COVID-19 num período de 24 horas. Para comparação, no início de novembro as mortes haviam sido reduzidas a cerca de 200 por dia. Quinze dias após o Natal saltamos para acima de 1000 mortes por dia. Dez dias após o carnaval voltamos a bater recordes acima dos 1.500.
No entanto, os casos mais dramáticos acontecem com pacientes em situação grave, que têm poucas chances de sobreviver se não forem internados em UTI. As famílias ficam desesperadas vendo a vida dos seus entes queridos se esvair sem que haja o que se possa fazer. Os pacientes esperam em casa, nos corredores dos hospitais, em macas de ambulância.
É triste.
No desespero, muitos recorrem à Justiça. Os juízes geralmente atendem ao pedido da família e mandam que o prefeito, o governador ou o regulador do SUS interne o paciente imediatamente. Entretanto, a ordem é ineficaz. O juiz pode até multar ou mandar prender quem descumprir sua ordem. No entanto, sua ordem não tem o poder de fazer a única coisa que precisa ser feita: fazer aparecer um leito de UTI. Infelizmente, não há ordem judicial que faça isto acontecer.
Mas pode acontecer uma coisa muito cruel e antidemocrática: algumas autoridades, com medo das punições, podem tomar a decisão de internar aquele que tem a ordem judicial e deixar para trás aquele que está em situação mais grave ou está esperando na fila há mais tempo.
Está situação oficializa uma das coisas contra a qual os brasileiros mais reclamam na atualidade: o fura filas.
Para aquele paciente que obteve a ordem judicial e foi atendido porque outro perdeu sua vez, parece que tudo ficou bem. Mas e para o paciente que estava na fila e foi preterido? Como ele se sente? Como a família dele se sente?
Como fica a ética quando um paciente menos grave ou com tempo de espera menor passa na frente de outro mais grave ou com tempo de espera maior?
Com justa razão, todos se insurgem contra quando o fura filas é um político, uma autoridade ou mesmo um amigo ou parente da autoridade. Mas o que se pode fazer quando o fura filas tem uma ordem judicial?
Seja como for, quem não quiser correr o risco de contrair COVID-19 e não ter nem como ser atendido, o melhor mesmo é tomar todas as precauções de praxe: não participar de aglomerações, usar máscaras, lavar as mãos com frequência, manter distância mínima de dois metros quando for necessário interagir pessoalmente.
Além disto, cada um de nós deve conter a ansiedade com relação à vacina. No ritmo de fabricação atual, e considerando a tremenda desorganização do Ministério da Saúde, não podemos ter a esperança de que a população será vacinada até o final do ano.
É por isto que esta semana praticamente todos os estados brasileiros estão decretando toque de recolher. É uma medida drástica, mas, considerando a disponibilidade zero de leitos de UTI (e até de leitos comuns), não parece haver outra saída.
Não há quem não possa sobreviver sem um baile de carnaval ou sem uma noitada com os amigos. No entanto, muitos não conseguem sobreviver ao COVID-19. E muitos não sobreviverão porque lhes faltará um leito para atendimento médico de qualidade.
Ponderando sobre as vidas perdidas e as vidas salvas, não vale a pena fazer este pequeno e temporário sacrifício de isolamento social?