Um passeio pela cachoeira Troia e pelas matas de BD

Para um paulistano, Bom Despacho é uma espécie de Kinder Ovo, aquele misto de chocolate e brinquedo infantil, que traz sempre uma surpresa para as crianças e adultos que o consomem. A cada passeio de carro, de bicicleta ou correndo sempre encontro lugares encantadores. Insisto sempre em dizer que Bom Despacho é lindo para um paulistano, pois tenho a impressão que os moradores da cidade, já com seus olhos acostumados às belezas locais, acabam achando que todos esses lugares encantadores não passam de coisas comuns, que estão em todos os lugares. Isso não é verdade: quando envio as fotos dos lugares que tenho descoberto por aqui para meus amigos em São Paulo, Grécia ou Estados Unidos, todos eles respondem com exclamações e palavras de pasmo.

Há quinze dias, fiz uma corrida de vinte e um quilômetros, sendo que uma parte deste trajeto foi uma grande descoberta para mim. Neste dia, corri pelos Cristais, passei pelo Rio Picão, passei na lateral da Fazenda Aruanda, ou seja, não virei na estradinha da entrada da propriedade, seguindo reto. Neste trecho há muitas plantações de eucaliptos tanto à esquerda, quanto à direita. Depois de uns dois quilômetros há uma estradinha à esquerda, que já corri por ali há umas semanas, mas não virei nesta estradinha de chão e continuei reto. Neste trecho eu nunca havia passado. Dos dois lados há uma mata nativa, linda, com muitos bichos para serem observados. Como esta estradinha é bem estreita, tive a sensação de estar correndo em um túnel natural, com muita sombra e uma natureza exuberante. Corri nesta pequena estrada de chão por uns quatro ou cinco quilômetros e nem vi o tempo passar, tamanho o prazer de estar ali. Voltei pelo mesmo caminho, o que dobrou minha alegria, apesar do cansaço físico.

Quando narrei minha aventura para minha sogra, descobri que ela nunca havia passado por estas plagas, apesar de ter passado quase toda sua vida em Bom Despacho. Foi um choque para mim e esse fato acabou aprofundando minha ideia de que os bom-despachenses dão pouca importância às belezas nativas.

Dias atrás, fui com minha namorada bom-despachense conhecer a Cachoeira Troia. Antes, passamos por uma antiga hidroelétrica que abastecia a cidade de Bom Despacho no passado e que fica a uns sete quilômetros da Cachoeira Troia. A estrada de chão entre a antiga hidroelétrica e a cachoeira já vale o passeio. Lindas paisagens unem esses dois pontos.

Chegando à Cachoeira Troia fiquei embasbacado. Um lugar com várias pequenas quedas d´água em sequência, uma mais bonita do que a anterior. Com cinquenta e poucos passos, chegamos a uma praia natural, com areia similar às das melhores praias do país. Neste local, a alguns metros das corredeiras, podendo vê-las à nossa direita, pudemos nadar com tranquilidade. Com várias pedras grandes à mostra no meio do Rio Lambari, aproveitamos para descansar sobre estas rochas, curtindo o sol e, quando cansados do calor, voltávamos para as águas frias do rio até chegar a uma nova pedra para novo período de relaxamento. Passamos muitas horas neste local, devidamente abastecidos por cerveja bem gelada, compradas no único bar que funciona na beira do rio, atendidos pelo simpático casal que cuida do local.

Durante estas várias horas que aproveitamos o sol e as águas do Lambari, os únicos sons disponíveis eram os pássaros e a sinfonia das águas (melhor seria definir como Concerto para águas e natureza), sons capazes de acalmar os mais estressados cidadãos paulistanos.

O momento engraçado do passeio aconteceu quando eu e minha namorada bom-despachense decidimos correr um pouco pelas estradas de terra, a mesma que citei acima como sendo belíssima. A uns dois quilômetros da Cachoeira Troia vimos um grupo de bois e vacas, (umas cem aproximadamente) que iam saindo de nosso caminho enquanto passávamos. Em algum momento, vimos um número ainda maior de animais que estavam bem no meio da continuação da estrada. Ficamos ressabiados e decidimos voltar, mas o primeiro grupo de vacas e bois havia ocupado a estrada, ou seja, estávamos no meio de dois grandes grupos de grandes animais. Para um paulistano, isso significa “medo”. Decidimos continuar correndo por uma minúscula estrada que saía da estrada principal. Após duzentos metros, nos deparamos com uma porteira. Decidimos voltar pela mesma estradinha e tentar a correr pela estrada principal, encarando os bois e vacas. Porém, um grupo de vinte animais começou a correr atrás de nós e, apavorados, voltamos para perto da porteira. Ficamos ali por uma hora, até que decidimos passar pelo meio do pasto (minha decisão) ou pela beira do rio (decisão de minha namorada bom-despachense). Cada um por seu caminho, enganamos o grupo de animais, e nos encontramos uma hora depois, deixando as vacas e bois para trás. Decidimos que este não era um bom dia para corrermos.

Quando voltamos para a beira do Rio Lambari, o dono do bar nos disse que as vacas e bois correram atrás de nós pensando que daríamos comida ou sal para eles. “Elas não pegam, não”. “Sei…”, pensei. Na dúvida, um paulistano prefere não arriscar. Afinal, os animais eram bem maiores do que eu e minha namorada bom-despachense juntos.

Em duas semanas conheci dois lugares maravilhosos e que ficarão para sempre em minha memória. Pretendo correr amanhã novamente pelas matas que mencionei e não vejo a hora de voltar para a Cachoeira Troia. E quem sabe, levo minha sogra para conhecer esses tesouros, que ela ainda não se deu ao luxo de visitar.

Alexandre Magalhães

Alexandre Sanches Magalhães é empresário, consultor e professor de marketing, mestre e doutor pela USP e apaixonado por SP e BD

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *