O que é Espondilite Ancilosante, efeitos e tratamentos possíveis
A espondilite ancilosante é uma doença incapacitante, progressiva e incurável. Quando ataca, sua principal característica é a dor. Muita dor. Dor que pode ir da cabeça aos pés e avançar pelos braços e tórax. No entanto, suas regiões preferidas são o pescoço, a coluna inteira, as nádegas e as pernas. Estranhamente, a dor piora com o repouso. Por isto ela incomoda mais quando o paciente fica sentado ou se deita. O momento mais dolorido vem com o sono da noite, seguido pelo frescor da manhã. Por isto tanto é difícil dormir quanto é difícil levantar-se de manhã. Nesta hora o corpo fica rígido; o paciente se sente entrevado. Começar a movimentação do dia parece tarefa impossível. Se é consolo, na parte da tarde costuma haver um pequeno alívio que segue até a hora de voltar para a cama. Mas deitar-se e achar uma posição confortável também não é fácil.
O nome da doença é significativo. Espondilite significa inflamação das vértebras (portanto, da espinha). Muitas vezes a inflamação vai da cabeça ao cóccix. Já o termo ancilosante (também se diz anquilosante), significa que a doença leva ao enrijecimento, à imobilização. O paciente fica duro, inflexível. A coluna não gira para um lado e para o outro e não se dobra para a frente e para trás.
No início a pessoa não se mexe por causa da dor; depois ela não se mexe porque as vértebras se colam umas nas outras. Onde isto acontece, o movimento desaparece de vez. Não tem como consertar. Nunca mais.
Mas, a espondilite ancilosante não se limita à inflamação da espinha e das juntas, à dor generalizada e à perda dos movimentos. Ela também pode atacar os olhos (uveíte e irite), o coração (doença cardíaca espondilítica), os pulmões (fibrose), a pele (psoríase), o intestino (colite ulcerativa).
A espondilite é uma doença autoimune. Isto significa que a inflamação não é provocada por vírus, bactéria, um corpo estranho. Ela nasce dentro do próprio corpo. É o organismo contra si mesmo.
Nosso sistema de defesa existe para combater bactérias, vírus, fungos e coisas estranhas em geral que nos ameaçam. Nas doenças autoimunes o sistema de defesa fica enlouquecido e ataca o próprio organismo que deveria defender. É como um briga fratricida; uma guerra civil. É uma guerra intestina.
Não se sabe exatamente o que causa a espondilite. No entanto, sabe-se que a pessoa que tem o fator genético HLA-B27 está mais propensa a ter a doença. No entanto, para que a doença seja ativada, é preciso que haja um gatilho. As principais teorias sobre o gatilho dizem que ele está no intestino, sob a forma de bactérias, vírus ou alimentos venenosos, como açúcar e trigo. Uma vez disparado o gatilho, a doença não para mais.
Quantos sofrem com espondilite?
Segundo as estatísticas, 8% da população brasileira tem o fator HLA-B27. Destes, 20% terão espondilite. Com estes números, e supondo que a população de Bom Despacho seja de 65 mil habitantes, concluímos que entre nós há cerca de mil pessoas sofrendo com a doença.
Onde estão estes sofredores?
Estão por aí. São mais homens do que mulheres. Estão sofrendo com dor nas costas, nas pernas, nas nádegas, no pescoço. Estão se tratando com analgésicos, anti-inflamatórios, bolsa de água quente, repouso. Estão pensando que “deram um jeito” nas costas e que terão que abandonar o trabalho pesado e as atividades físicas.
Este desconhecimento da própria doença é comum. O diagnóstico da espondilite nem sempre é fácil. Tanto que é de 9 anos o tempo médio entre a pessoa reclamar de dor nas ancas e ter um diagnóstico conclusivo. Ao longo deste tempo, a doença pode se agravar bastante. Se o paciente tiver a sorte de analgésicos e anti-inflamatórios funcionarem, ótimo. Ele vai sofrer menos. Mas, se não tiver tal sorte, vai penar por anos e tomar remédios variados até arruinar seu aparelho digestivo, rins, fígado. Com o devido tempo desenvolverá doenças iatrogênicas que exigirão mais medicamentos e mais riscos.
Mas há um aspecto da doença que merece ser destacado. No início ela é só dor, desconforto, fadiga, indisposição. Nada disto pode ser visto por outra pessoa. Estas coisas não aparecem nem mesmo nos exames de imagem. É nesta fase que o paciente sofre com a suspeita e até a acusação de que não tem nada, mas está fingindo ter dor para fugir do trabalho e não cumprir suas obrigações. Isto magoa. É uma dor que vem da alma. Não há bálsamo que a leve embora.
Somente quando a doença já avançou bastante é que seus efeitos podem ser vistos nos raios X. A inflamação pode ser identificada no exame de sangue, mas não há como saber que ela foi causada pela espondilite. A ressonância magnética identifica a inflamação nos ossos, juntas, tendões. Mas, por ser um exame caro, ninguém o faz logo no início.
Por tudo isto, o paciente fica sem um diagnóstico preciso. Neste meio tempo, vai se tratando com analgésicos.
Tratamento
Espondilite não tem cura. Em algumas pessoas ela avança rapidamente; em outras avança mais devagar, mas avança sempre. Os medicamentos receitados se destinam a eliminar a dor. São analgésicos, anti-inflamatórios não esteroide, hormônios e biológicos.
Analgésicos e anti-inflamatórios como aspirina e ibuprofeno podem amenizar a dor, mas, com o tempo, causarão danos no aparelho digestivo, rins, fígado. Hormônios como a cortisona podem aliviar, mas causam problemas no corpo inteiro. Quanto aos biológicos eles já assustam com os próprios nomes: Adalimumab, Certolizumab, Etanercept, Infliximab, Golimumab, Ixekizumab, Secukinumab. Quem vai querer tomar uma coisa destas?
Do lado bom, quando dão certo, os biológicos controlam a dor. Alguns médicos acreditam até que eles desaceleram o avanço da doença, mas isto não está provado. Do lado ruim os efeitos colaterais e os riscos são muitos.
Os biológicos são tomados em hospitais sob forma de injeção. Não é recomendável tomar em casa. As injeções doem na pele e doem no bolso. Custam milhares de reais por ano. Além disto, provocam a recidiva da tuberculose e baixam a imunidade contra todo tipo de infecção.
Enfim, o tratamento não é para curar, mas para aliviar a dor e melhorar a mobilidade.
Alternativas
Na prática, há apenas dois tratamentos que melhoram a espondilite sem criar outros problemas. O primeiro é o exercício físico; o segundo, a alimentação.
Com o corpo dolorido é difícil o paciente fazer exercício. No entanto, ele precisa começar. De início, com movimentos leves e suaves. Por exemplo, posturas de ioga e movimentos de tai chi chuan. Caminhadas também. Muitas, ainda que bem devagar. Com o passar dos meses e anos, o paciente poderá fazer exercícios mais vigorosos e enérgicos, como nadar, pedalar, trotar.
Na espondilite, o repouso tem efeito deletério. Quanto menos exercício a pessoa fizer, mais dor sentirá. Com o tempo, perderá músculo (sarcopenia) e perderá o equilíbrio. Com isto aumentará o risco de acidentes, como cair e quebrar ossos.
Mas não convém que o paciente vá para academias. Exercícios com peso e com máquinas aumentam os riscos. Melhor fazer atividades como ioga e tai chi chuan. Estas modalidades têm movimentos e posturas que vão desde o muito fácil até o muito difícil. Assim, o praticante pode sempre ajustar a dificuldade às suas possibilidades. Ao mesmo tempo, exercitará o corpo inteiro, e não apenas alguns grupos musculares.
Quando à dieta, é infeliz que os médicos em geral e os reumatologistas em particular a desconheçam como tratamento para espondilite. Muitos doentes já descobriram que a dieta é fundamental. Há alimentos que aumentam a dor quase instantaneamente. Outros aliviam a dor quando consumidos com persistência.
Por exemplo, muitos pacientes já observaram que o açúcar em particular, e os carboidratos em geral aumentam a dor e a rigidez. O amido costuma ser particularmente nocivo. Junto com os carboidratos estão também os óleos comuns, como de soja, de milho, de arroz, de canola. As frutas em geral também são ruins. Especialmente as mais doces.
Do lado bom, temos a manteiga, banha de porco, óleo de coco, azeite de oliva, óleo de abacate e de gergelim. Para a maioria dos pacientes, estas gorduras aliviam a dor.
Entre as frutas, duas são excelentes: abacate e coco da Bahia.
Para quem não tem alergias, ovos, carnes e queijos completam os macronutrientes.
Para completar e encerrar a lista boa, repolho e verduras folha escura em grandes quantidades.
Esta é uma dieta que tem funcionado para muita gente. Muitas vezes funcionam melhor do que os medicamentos. Como a doença não tem cura e o tratamento é para a vida toda, é melhor que façamos algo que faça o bem e não tenha efeitos colaterais inaceitáveis. Exercícios e boa comida atendem a estes requisitos.
Você tem a doença?
Será que você está entre os mil bom-despachenses que foram sorteados com a doença? Se você tem dor na coluna, se a dor muda de lugar e de intensidade, se piora à noite, se a dor chega às vezes às nádegas e às pernas, talvez você tenha espondilite. Da próxima vez que for ao médico, pergunte o que ele acha. Mas, por via das dúvidas, desde já melhore sua alimentação e faça exercícios. Prevenir ainda é melhor do que remediar. Mesmo que você não tenha espondilite, boa comida e bons exercícios só vão lhe fazer bem.
Desfecho da doença
A foto do Frei Damião e o daguerreótipo de Leonard Trask mostram o modo como a espondilite ancilosante age sobre a coluna do paciente. As imagens falam por si mesmas. No entanto, não precisa haver desesperança.
Exercícios e comida adequada podem ajudar muito. Se necessário, um analgésico ou outro de quando em vez, para superar os momentos de muita dor.
No mais, há esperança e há futuro. Padre Cícero – que ao que tudo indica tinha espondilite – viveu até os 90 anos. Frei Damião, apesar da doença, viveu até os 99 anos.